Falta uma pitada de revolução
4 de setembro de 2018 § 23 Comentários
Artigo para o Estado de S. Paulo de 4/9/2018
O maior trunfo de João Amoedo e seu Partido Novo são os obstáculos que ele próprio interpôs entre ele e o poder e o que mais ha de contraintuitivo na sua candidatura. Porque um homem que declara R$ 425 milhões de patrimônio volta-se para a política no país onde ela é pouco mais que um meio para enriquecer? Como um partido desconhecido pretende ser votado se, com não mais que 5 segundos de televisão, veda a absorção de políticos eleitos por outros e proibe qualquer coligação que possa aumentar sua exposição?
Mas são também as contradições que o retiram do saco onde estão os outros que deixam sem solução o problema do timing.
Se houvesse no programa do Novo um componente tão claramente revolucionário que a exigência de adesão a ele confirmasse acima de qualquer suspeita a repulsa ao fisiologismo ficaria aberta a porta a um crescimento legitimo em tempo hábil para um país que já não pode esperar, e tudo poderia acabar sendo diferente. Mas o Novo não foi muito além das suas normas internas o que não é pouco mas não é o bastante. Exigir ficha limpa, recusar o uso de dinheiro público em benefício próprio, reduzir luxos e mordomias, extinguir ministérios, acabar com o toma lá da cá, eliminar privilégios da corte, tirar o estado do papel de empresário são itens tão clamorosamente requisitados nesta altura da desgraça nacional que quase todos os candidatos, com variações de ênfase aqui e ali, os incluem entre suas promessas. O que torna críveis as de João Amoedo, é verdade, é o rigor com que tem exigido dos seus quatro vereadores eleitos a frugalidade que prega. As normas operacionais internas do partido são idiscutivelmente inovadoras. Mas qual a norma operacional inovadora que o Novo oferece para gerir um país que precisa se reinventar de cabo a rabo?
Reformule-se a pergunta na linguagem dele. O profissional de finanças João Amoedo investiria o dinheiro dos seus clientes numa empresa tendo como garantia somente a enumeração das “metas de curto prazo transformáveis em bonus” (no caso eleitorais) pelo “executivo da hora”? De jeito nenhum! O que ele examinaria com lente antes de se tornar acionista seria o quanto essa empresa adota das melhores práticas internacionais de governança e os mecanismos por ela criados para antecipar-se às demandas de seus clientes e impedir a acomodação de seus quadros na busca da inovação permanente pois ele bem sabe que é isso que cria uma “cultura” que sobrevive às pessoas e dá às empresas condição de crescer de forma sustentável na era da disrupção.
A ausência de um componente que emule essa parte da experiência profissional de seu criador é a falha mais visível no projeto do Partido Novo.
Como governar com esse congresso? No debate político brasileiro até as perguntas são conformistas. E esta, que os jornalistas repetem a todos os candidatos, telegrafa a resposta do costume – “Com a renovação de todos os políticos eleitos” – que implicitamente isenta “o sistema” e põe a culpa pela desgraça nacional nas suas vítimas que sempre “votam errado”. Olimpicamente, perguntados e perguntadores ignoram o pormenor de que a essência do “sistema” — este ao toque do qual tudo quase imediatamente apodrece — é não permitir renovação.
A questão que interessa é como manter o congresso, que hoje pode dar-se o luxo de jogar contra, jogando a favor do povo sempre? E mais: Como tornar o Judiciário passível de responsabilização sem comprometer a sua desejável independência, para que não continue revertendo todas as reformas que o país consegue fazer literalmente movendo montanhas? Estas sim definem quem vence o duelo final que se aproxima, as corporações donas do estado sob a “nova direção” de turno, ou o Brasil que paga essa conta leonina cada vez com mais sangue que suor.
O Partido Novo propõe-se trazer o Brasil para o século 21 e chega à arena mais fresco e livre de senões que todos os seus oponentes. Mas ninguém conseguirá realizar essa proeza sem implementar antes as revoluções dos séculos 19 e 20 que o Brasil pulou. Sim, o que pode haver de mais tóxico para o feudalismo maquiado à brasileira no qual o favelão nacional sustenta o luxo da corte e filho de cacique cacique é, é submete-lo ao que ha de mais velho na democracia moderna. Igualdade perante a lei, separação dos poderes com o objetivo de controlar o estado e garantir os direitos individuais, designação do esforço investido por cada um na obra coletiva como único meio de legitimação da diferença. Todo o receituário do século 18, enfim, faz parte do credo que o Partido Novo afirma e que está inscrito até na nossa constituição. Só que para fazer deles mais que um belo discurso foi preciso, na virada do 19 para o 20, mudar o poder de dono levando à sua expressão mais objetiva e concreta o princípio decisivo da hegemonia do povo. Voto distrital puro para garantir a fidelidade da representação do país real no país oficial e para tornar operacional mudar com segurança no ritmo da necessidade, direito de retomada de mandatos e referendo das leis dos legislativos a qualquer momento para lembrar sempre quem é que manda, eleições de retenção de juízes para prevenir marchas-à-ré. Mas esse complemento, que fez da revolução prometida uma revolução de fato, é a parte que está ausente da pregação do Novo.
Uma pena! Na falta do que carregue a carga revolucionária que o Brasil tem dado todos os sinais de estar procurando, resta ao eleitorado esquecer a proatividade e orientar-se defensivamente. A prioridade zero passa a ser votar como for preciso para garantir a vitória do campo democrático sobre o campo venezuelizante e renovar quadros do presidente para baixo para abrir caminho a mudanças futuras fica como segunda prioridade porque orientar-se por nuances e diferenças apenas de tom, por mais afirmativas e verossímeis que sejam, são luxos de quem já tem garantida pelo menos a natureza do regime.
Perfeito! O Brasil não precisa do Novo, mas do Velho! Do velho capitalismo e da velha democracia. Tenho dito isso pra todo mundo!
Em tempo. Troquei mails com eles do Novo; são fracos. A seara deles é a administração de empresas como arcabouço teórico e prático. NO entanto, fiz a todos que mantive contato uma pergunta simples: como tornara a empresa brasileira competitiva? Não souberam responder! Confundiram empresa com negócio! Alertados, saíram-se com a resposta de sempre: Educação!
Todavia, a questão maior os torna levianos, irresponsáveis. Como não se coligar num momento como este em que os fascistas de preto e vermelho são a desgraça a ser derrotada?
MAM
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Sim, eu concordo que falta mais ousadia nos planos do novo, mas essa comparação com investimento é meio esdrúxula, pois, na política os resultados são muitas vezes – ou quase que sempre – imponderáveis. Isto porque a ordem de valores nos investimentos da politica e do mercado financeiro ou das empresas é completamente diferente. Entendo que o autor quis fazer uma comparação aproveitando a habilidade de Amoêdo com investimentos e finanças, mas tudo do capital que se compara com a política se perde no vazio. Na minha opinião, o Novo está fazendo primeiro aquilo que se pode e se deve fazer internamente num partido: moralizá-lo. Seria como naquele ditado popular: “Ele quer acabar com a fome no mundo, mas se esquece de ajudar a mãe a lavar a louça do almoço.” 🙂
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a ser verdade que é isso que ele faz, não precisaria concorrer à presidência. Melhor dizendo, não deveria! Muitro menos deveria bater no peito e rejeitar alianças com o real. MAM
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Não é a vez do Novo agora. Como bem comentado acima, eles precisam amadurecer. Esta é a ultima chance que o Brasil tem para se livrar de iminente cubanização e só temos um candidato com disposição de tentar fazer isso.
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Concordo com a insistência à adoção do voto distrital.
– como chegaremos a ele?
– não seria uma expectativa utópica para o Brasil dos próximos anos?
– por fim, se chegassemos a ele, por um milagre, fico com medo do que o eleitorado brasileiro vai escolher.
– não nos esqueçamos que apesar de todos os estragos já feitos no Brasil pelo PT seu principal ícone continua sendo o ídolo principal do eleitor. Será?
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eu nao tenho medo do eleitorado brasileiro. tenho medo das nossas “elites”…
https://vespeiro.com/2018/08/14/democracia-a-mao-armada/
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Eu tbm!!!!!
Querem um exemplo? Assistam na Foxnews a sabatina do juiz cavenaugh que está sendo conduzida no Senado americano e vejam com seus próprios olhos.
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O Gen. Mourão propôs o voto distrital puro na palestra que ocorreu no SECOVI-SP no dia 17/09. Eu estava lá a ouvi. Ele foi muito aplaudido por isso.
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já é alguma coisa…
mas o importante não é o voto distrital em si mas o que ele permite fazer com garantia de legitimidade se e quando se quiser por o poder de fato nas mãos do povo, como ja mostrei em tantos artigos (o ultimo, aí embaixo, “Democracia à mão armada”).
mas dessa parte, que é a decisiva, NINGUEM fala.
o Brasil tem horror ao povo. e, eventualmente, tem horror a quem está, no momento, mandando no povo, e aponta outro melhor ou menos mau para mandar no povo.
mas jamais para ser mandado pelo povo.
isso sim, muda tudo, e para sempre. nunca mais teríamos de nos preocupar com a natureza do regime.
só que isso ninguém quer. até o povo esta muitíssimo bem treinado nestes 518 anos, para não confiar em si mesmo.
dá pra contar nos dedos quantos democratas de verdade vivem e votam nestes Tristes Trópicos.
a ultima vez em que estivemos parelhos com a ponta mais moderna do pensamento político foi nos últimos anos em que fomos “gente sem rei”, lá com o Tiradentes, um verdadeiro “americano” na acepção mais revolucionária e anti-europeia do termo.
de 1808 em diante só trocamos de rei. ficamos nessa de reduzir riscos entre os sonhos de poder dos populistas e dos positivistas, dos bolivarianos e dos anti-bolivarianos da hora que também não vêm nada de mais em ficar por “lá” 21 anos…
humildemente, eu alerto: bolivarianismo nunca! mas daquele jeito de novo também não, ou não sairemos nunca dessa nossa idade média.
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Olá, Fernão, Só queria comentar que há alguns candidatos do NOVO (entre os quais eu mesma) que defendem o voto distrital puro, convencida de que fui de que é o único caminho possível para endireitar o Brasil.
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E a propósito, já chegaram “The Constitutional History of England” e os três volumes da biografia de Ted Roosevelt, que vão ficar para depois de 7 de outubro.
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sao otimos!
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beleza, tereza.
e lembrando sempre que o mais importante
é dar aos eleitores poderes PARA DEPOIS DA ELEIÇÃO.
o voto tem de ser o distrital
puro só para eles poderem exercer os direitos
de retomada de mandatos (recall) e referendo
das leis dos legislativos com plena garantia
de legitimidade.
ou seja, a beleza do voto distrital puro está
em deixar exatamente claro que eleitores
têm o direito de demitir quais deputados quando
eles trairem o voto que lhes deram, a qualquer momento.
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Olá Fernão…tu não escreveria esse texto caso tb não visse o Novo “mais frescor e livre… que todos os seus oponentes”. Por isso sou apoiador e resignado com o menos pior no 2º turno (se houver). Mas concordo com teu texto, é preciso a revolução sim, a que tu vens descrevendo ao longo de vários artigos que acompanho. A pergunta: É possível fazer a revolução através das ferramentas hoje disponíveis e com a atual forma do congresso? Será necessária uma nova constituinte? Já decorei o diagnóstico de tanto ler teus textos e concordo, mas assim como”falta” algo ao NOVO, falta você rascunhar como fazer a revolução, não? Aguardo artigo sobre isso.
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só tem um jeito, arnaldo.
propondo-a ao Brasil a partir de uma tribuna
alta como a de candidato a predidente. se sem
ela e quase sem tv o amoedo ja esta esbarrando
nos 5%, imagine com!
o outro caminho é a rua. umas tantas manifestações
como as de 2013 com todo mundo pedindo
a mesma coisa derruba ate poste do Lula.
e tem um monte de gente no Novo que sabe
fazer isso.
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O que diz a respeito do voto distrital com recall o Amoedo, o Chequer, enfim as lideranças do Novo? Realmente falta a pólvora para o Novo decolar de vez e esta pólvora certamente é a devolução do governo ao povo pelo voto distrital com recall. Fernão, você já foi contatado pelo Novo para dar sua contribuição, ao menos teórica?
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só por alguns entre eles. mas está andando…
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Isto é mesmo um trabalho de pregação como fizeram os apóstolos. Trata-se de doutrinação, pois, infelizmente, a imensa maioria dos brasileiros desconhece os avanços das melhores e mais desenvolvidas democracias do mundo – que, por acaso, estão tbm entre os mais desenvolvidos países do mundo. Tudo graças à nossa índigente imprensa e sistema educacional igualmente paupérrimo.
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Novo… Que de novo não há absolutamente nada. Sob as vestes de um purismo pragmático caminha a velha cantilena do mercado. O país deixou de ser só um fazendão para de umas década pra cá ser regido pelas leis do tal Deus mercado. Vêm com a falácia de que a política atrapalha o mercado. Piada de mau gosto. A atual política é quem sustenta o rentismo do mercado.
O novo partido Novo dos banqueiros carrega até na cor a bandeira de um deles.
Ps. procurem quem são os maiores doadores do Novo. Nada de novo, só de novo.
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Enquanto o voto distrital não vem, pelo sim pelo não é 30 de ponta a ponta.
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No princípio fui tentado a acreditar. Perdi o entusiasmo quando vi o senhor Paulo Brant como candidato a vice-governador de Minas.
Esse eu conheci quando desempenhava a função de vice-presidente do
Bemge – Banco do Estado de Minas Gerais que foi à falência .
Um episódio triste aconteceu em meu contato com o dito senhor.
Não conto aqui por não ter provas e não se tratar do Foro adequado.
Tenho testemunhas.
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E agora Fernão? Será que o povo exigirá a ruptura? Haverá bastilha nessa terra em que o povo é mantido na ignorância?
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Repito aqui o comentário do artigo anterior. “Não estamos numa situação em que se possa analisar o Bolsonaro como sendo ou não o melhor, ele é o único que se propõe a nos tirar dessa situação. Ou ele ou a venezuelização com um “maduro” bananeiro comendo num restaurante de US$ 1.300,00 o prato enquanto a população come lixo. Até não é muito diante do vinho de R$ 29.000,00 a garrafa que o irmão do Toffoli tomou para comemorar a posse no STF e dos que o luladrão tomava. Já temos muitos maduros.”
A propósito do voto distrital puro, o Gen. Mourão fez essa proposta na palestra do dia 17/09 no SECOVI-SP. Eu estava lá e ouvi. Também todas as barbaridades que a imprensa disse que ele falou, foram pinçadas fora do contexto para desacreditar o vice.
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