Novas tecnologias, velhos problemas

27 de setembro de 2016 § 19 Comentários

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Artigo para O Estado de S. Paulo de 27/9/2016

Estive segunda-feira, 19, em Belo Horizonte para o 7º Fórum Liberdade e Democracia do Instituto de Formação de Líderes. Bom ver empresários investindo tempo, dinheiro e competência não só para melhorar o Ebitda do próximo exercício mas para tornar o meio ambiente intelectual e institucional brasileiro tão acolhedor para o empreendedorismo, a inovação e a criação de empregos e riqueza quanto já foi quando crescíamos mais que o resto do mundo.

Reconfortante reencontrar um Brasil preocupado em “cultivar”, conceito que para além do de plantio embute o de educação para o melhoramento de “sementes” e o bom desenvolvimento delas, depois desses anos todos de usurpação da cena pelo “extrativismo selvagem” desses personagens sinistros da beira da economia privada que encosta na politicalha para assaltar o Estado e submeter a Nação pela corrupção.

Não ha outro caminho senão um esforço metódico de reeducação promovido pelo Brasil que presta para reconstruir sua identidade perdida e retomar o protagonismo para reerguer o país do tsunami de amoralidade em que se afogou.

salto6

Por todo o medo misturado a encantamento que despertam era inevitável que num evento sobre “Liberdade de Escolha na Era da Inovação” as novas tecnologias, neste limiar da conquista da autonomia do seu próprio desenvolvimento futuro com o advento da inteligência artificial predominassem nas apresentações. A “liberdade de escolha” ficou como de fato está no mundo do aqui e agora: no segundo plano a que a relegou a inexorabilidade dessa revolução para a geração “que testemunhará a morte da morte pelo desenvolvimento da medicina e da biogenética em menos de 30 anos” e passará a “viver para sempre” numa ainda indefinível conjuntura da qual estarão ausentes todas as estruturas conhecidas de produção e de trabalho…

…ausentes estas mas com certeza não, é bom não esquecer, a eterna força de corrupção que “O Poder” exerce sobre nossa espécie…

Ha muita confusão no ar. O fato da tecnologia estar provocando a “disrupção” dos poderes do Estado Nacional não é uma notícia tão boa como pode parecer à primeira vista para todos quantos têm bons motivos para festejar a queda dos seus antigos algozes. Esses poderes estão apenas sendo substituídos por outros ainda mais amplos. A tecnologia muda muita coisa mas não muda a natureza humana. E a única que não tem visto qualquer desenvolvimento desde a sua versão “ponto3” que data de 1776 (Atenas, Roma, Inglaterra/EUA) é a que trata de manipular essa natureza para permitir ao homem proteger o homem do homem, dita “democracia”. Nada melhor foi inventado ainda.

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Acontece que a liberdade se materializa, dentro das sociedades economicamente orientadas em que nos congregamos, essencialmente nas nossas dimensões de produtores e consumidores. Nada da vasta coleção de “direitos” que se abrigam por baixo do grande chapéu da “cidadania” se transforma em realidade palpável se não houver um grau suficientemente amplo de opções de livre inserção e mobilidade nos universos do trabalho e do consumo.

Isso é ponto pacífico, conforme já ficou provado com rios de lágrimas e sangue, mas não é tudo.

Tendo assumido a forma que lhe deu a elite intelectual do Iluminismo que emigrou para o “Novo Mundo” em função do “milagre” da disseminação da propriedade da terra em pleno feudalismo europeu que a “descoberta” da América ao norte da nossa proporcionou, a História permite afirmar com segurança que a “democracia.3” foi antes a resultante que a causadora daquele inédito processo de distribuição de riqueza. O processo de reconcentração da propriedade chegou, entretanto, ao auge nos Estados Unidos da virada do século 19 para o 20. Para salvar da morte o capitalismo que a democracia engendrou pela retirada do apoio popular que teve durante a fase de aumento da riqueza coletiva, a legislação antitruste foi adicionada à receita original. Essa reforma estabeleceu, agora formalmente, a preservação das liberdades essenciais de escolher um trabalho e negociar preços justos com uma multidão de fornecedores sem as quais nenhuma outra se estabelece como o “Valor nº 1” do sistema, acima até das conquistas do indivíduo pelo merecimento que definem a revolução americana.

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Só que a diluição da “democracia.3” no oceano sem fim da miséria dos egressos do socialismo que a internet derramou da Ásia para os mercados de trabalho e de consumo planetários a partir dos anos 80 do século 20, agora sem leis nem fronteiras, empurrou o que foi o capitalismo democrático de volta para a competição sem limites que tende aos monopólios e quase o matara um século antes.

A sinuca sintetizada na alternativa “crescer ou morrer» é de longe o maior desafio que a causa da liberdade já enfrentou. Se Estados Nacionais desenfreados como o brasileiro têm o poder de dar ou tirar a condição de sobrevivência econômica do indivíduo, as gigantescas entidades globais que as novas ferramentas engendraram e engolem tudo à sua volta em escala planetária e à força de bilhões terão amanhã, como demonstraram muito convincentemente os entusiastas das novas tecnologias no evento de Belo Horizonte, o poder de prover ou negar até a vida eterna a quem lhes interessar possa.

Foi sempre complicada essa história de homens que, por não serem anjos, requerem ser governados por outros homens que não são anjos de que falava James Madison. Agora que é de toda a humanidade que se trata não ficou mais fácil. Mas tanto a doença quanto o remédio continuam sendo os mesmos de sempre: “democracia“, com pesos e contrapesos, na economia inclusive e principalmente.

O consolo para os últimos da fila, como nós, é poderem sempre copiar o que já está feito e deu certo como fizeram os japoneses, os coreanos e estão fazendo os chineses, e passar voando por cima dessa anacrônica miséria a que nos deixamos reduzir para nos juntarmos ao resto da humanidade no enfrentamento apenas dos problemas que ainda não se sabe como resolver. Basta quere-lo o bastante.

salto6

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§ 19 Respostas para Novas tecnologias, velhos problemas

  • Gustavo Freitas disse:

    Não deixe de ler o livro DESIFORMAÇÃO do autor Ion Mihai Pacepa. Na Estante Virtual é encontrado por um prêço módico. Vê-se claramente que esses comunistas não descansão com seus planos totalitários. Saudações.

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    • Carmen Leibovici disse:

      Não li o livro,mas concordo com a existência desses planos totalitários ,e obsecados, que vimos chamando de esquerda.Esse esquerdismo só traz desgraça e depravação,mas seus defensores persistem em implanta-lo em todas as partes desta terra.

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  • Márcia disse:

    A China está propondo o “Muda Mais com Dilma”, digo, “Muda Mais com Xi”. Qualquer coisa _ até o diabo_ menos o PC apear do poder. Essa é a raiz das mazelas do mundo.

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    • No Brasil existe um problema, desde antes das esquerdas terem voz ativa: chama-se governo. Nossas elites, também as de direita, são pródigas em se servir dos cofres públicos.
      Antes do comunismo ser implantado na Rússia, 1917, já trabalhávamos para sustentar o governo como fim em si mesmo, sem ainda os esquerdistas colocando em prática suas aberrações. Claro que, com eles no poder, tivemos que trabalhar dobrado para sustentar também à eles.
      Antes de nos fixarmos apenas na irracionalidade da esquerda, seja como governante ou apenas pelas suas idéias sem nexo, temos que aceitar que nossos “liberais” não são muito melhores. Chegaremos mais facilmente à soluções, se aceitarmos esta verdade.
      Família que rouba unida permanece unida, seja socialista ou liberal.

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      • Márcia disse:

        Gostei do detalhe das aspas na palavra “liberais”. Digamos que são liberais com alma esquerdista. Talvez por isso há uma simbiose tão perfeita entre eles e a esquerda reinante.

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  • Desculpe Márcia, mas em vez de clicar em “Comentários”, cliquei em “Responder”.
    Meu comentário não foi uma resposta ao seu comentário.

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  • Luiz Antonio Genaro disse:

    O Mundo está pobre de lideres. Nem a natureza vive sem lideres. O extrativista fala de um jeito, parece que ele tem um direito sagrado.

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  • Carmen Leibovici disse:

    Por isso que eu temo mais Hillary Clinton ,com seu perigoso “instituto clinton” agregador de poder ,do que temo Trump,com seu patriotismo e ,talvez,nacionalismo exarcebados.
    Hillary,Obama,e outros agregados,alguns muito maus, são ,a meu ver,feitos da mesma “matéria”que Lula,Vanessa Graziotin,Gleici Hoffman,Lindenberg Farias e etc ,todos puxados pela ideia que simboliza um “instituto lula”de poder global,que o BNDES ajudou a consolidar.
    Lula é um crasso espertalhão ,assim como seus companheiros,mas eles vinham acumulando poder o bastante para competir(ou se unir) com hillarys na detenção do poder de decisão futuro sobre quem terá ou não a vida eterna.
    Tivemos muita sorte de arrancá-los do contexto brasileiro e assim podermos resgatar a vida que ainda restava no deserto em vinhamos nos transformando e cultivá-la novamente.
    O futuro,assim como o presente,será definido pela ética,pela compaixão,pela bondade dos que detiverem o poder.
    Hitler-que sua memória seja obliterada-ainda pode renascer.Que sejamos e estejamos protegidos.

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  • Carmen Leibovici disse:

    Entre aspas fica melhor : “…do poder de decisão futuro sobre quem terá ou não a vida eterna.”

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  • Carmen Leibovici disse:

    Mais uma pequena correção:O futuro,assim como o presente,será definido pela ética,pela compaixão,pela bondade dos que detiverem o poder,PORÉM,Hitler-que sua memória seja obliterada-ainda pode renascer.Que sejamos e estejamos protegidos.

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  • Hitler, tinha o sonho delirante de uma Alemanha hegemônica e pagamos por isso com milhões de mortes e destruição. Lula, tem em si o próprio o hegemônico, suficiente a destruir o país começando com a amoralidade. O primeiro, goste-se ou não foi líder; enquanto o segundo mostrou-se um espertalhão de 5a categoria, e os que acreditaram nele perfeitos boçais e ou fanáticos.

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  • Novo problema, afora os indicados no texto, muita atenção ao presente.
    Será panaceia? Agora é o trinômio Teto dos gastos- Previdência- e Flexibilização dos contratos de trabalho pra baixar os juros! Se não for a necessidade das medidas porque não baixaram antes? E até que ocorram, como fazer sem dinheiro e consumo? Não será com aposentadoria aos 70 anos que venderá mais banana, café, arroz ou gasolina. Falta crédito, dinheiro digamos, mesmo com juros pornográficos de 300% cheque especial e cartão e 70% para duplicatas os bancos seletivos o tomador com medo da dívida amanhã. Os empresários poupadores não se arriscam diante de tanta incerteza.
    Urgem medidas, hoje a CNC (Comércio) noticia em 58,2% de inadimplência sendo 10,3% dos que não podem pagar. Ao Estado cabe uma solução, ao caso social, que dê liquidez a sociedade poder voltar a consumir pois é na micro onde tudo deve começar a ter efeito na macroeconomia.
    Se não, a vaca vai pro brejo. Em indo os efeitos são impossíveis de avaliar. Convulsão social será o mínimo. Menos proza e mais ação. Não obstante faltar comunicação, mesmo não enchendo barriga, não deixa de ser importante. Pobre país.

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  • Marcos Jefferson da Silva disse:

    Será Fernão que poderemos sempre copiar o que já foi feito e deu certo para nações mais desenvolvidas ou a oportunidade para essa virada civilizatória foi desperdiçada?
    Acredito que houve um grande desvio do caminho nesses últimos tempos e retomar o rumo certo exigirá muito mais do que querer bastante. Muito sangue, suor e lágrimas serão derramados para isso.

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    • Fernão disse:

      japão, coreia (e agora china), todos partiram de pontos bem mais baixos que o que o Brasil está hoje para dar o salto. levaram menos de 30 anos do zero ao que se tornaram

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      • Sem dúvida, começando com a educação e estímulo a poupança. Com ela passaram a ser modelos exportadores com competividade levando superavits graças as essas bases que permitiram usar bem o câmbio.
        Nós não temos educação e a poupança nos 3 níveis da administração pública é deficitário. Desconsiderando das famílias e não tão só por problemas culturais, se não por falta de estímulos. Até a manjada Poupança conseguiu o PT destruir o interesse. É muito complicado pro Brasil chegar a níveis satisfatórios de forma permanente. Temos convivido com “soluços, momentos” dependendo de fora quando tudo lá vai bem e nos dá liquidez.
        Não será o Temer a resolver. Serão anos de seriedade, inteligência e trabalho sem desprezar o que já deu certo onde for.

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      • Fernão disse:

        não é fácil para ninguém. mas o fator essencial é adotar as ferramentas institucionais que permitam submeter os governantes aos governados.
        tudo o mais depende essencialmente disso, inclusive o segundo passo que é transformar o investimento em educação de qualidade no objetivo Numero 1 do país.
        Aí os brasileiros todos q hj estão na Nasa, sequenciando genomas, criando Facebooks e etc. poderiam fazer tudo isso aqui mesmo.

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      • É verdade. Ferramentas existem. É só querer e usa-las como se deve. Exemplos não faltam. Falta trabalho e vontade política.

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  • Marcos Jefferson da Silva disse:

    Reforma Política urgente. Copiar dos países que deram certo.
    Voto distrital com recall. Mas a corte vai permitir essa mudança? Acho difícil. Preferem discutir foro privilegiado como se isso fosse alterar substancialmente alguma coisa.
    Discutir os privilégios do funcionalismo público ninguém quer discutir.
    Notícia recente: Desembargador do TJ-SP é aposentado compulsoriamente porque mandou soltar o maior traficante de drogas de SP.
    Continuará a recebendo seus vencimentos normalmente. Nem vou falar que paga essa conta.
    É a nossa Constituição que determina seja assim. Carta da República chamada por aí de “Constituição-cidadã”. É possível?

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