Democracia direta: a verdadeira e a “fake”
12 de março de 2019 § 6 Comentários
Artigo para O Estado de S. Paulo de 12/3/2019
A capacidade de adaptação às mudanças sempre foi o fator decisivo de sobrevivência das espécies. Nas sociedades humanas também. A velocidade de resposta das instituições à mudança é o fator decisivo de sucesso.
Os Estados Unidos só viraram o que são hoje porque ao longo de todo o século 20 tiveram um quase monopólio da flexibilidade institucional que a vida como ela é requer. O resto dos países europeus, dos quais o Brasil é um prolongamento, não nasceram democráticos como eles. Foram obrigados a se ir democratizando, de confronto em confronto, pelos oprimidos do absolutismo que conheciam do novo sistema inventado na América e os encantava pelos efeitos que produzia pouco mais que ecos.
Foi esse desconhecimento que permitiu que tantos adotassem da democracia o discurso mas mantivessem do absolutismo a essência. Os portugueses foram os mestres dessa arte. No “sistema corporativo” que inventaram, a “cabeça” (antes o Imperador e depois da Republica o Judiciário, o poder não eleito que herdou as prerrogativas dele) reserva a cada parte do “corpo” o “direito especial” que houver por bem lhe outorgar.
Esse “especial” e o poder de distribui-los ao seu bel prazer, a exata negação da essência da democracia cuja base é a igualdade de direitos, é o que nos mantém, a eles no poder, e a nós na servidão semi-feudal de que nunca saímos. Da “direita” ou da “esquerda”, com ou sem “revoluções”, eles vêm sempre dos 5% da população que recheiam as corporações que controlam o estado, as estatais e o poder de se auto-atribuir privilégios.
O círculo não foi rompido com o advento do governo Bolsonaro. O que ele representa é um movimento de subversão da hierarquia interna do “sistema” obtido com o recurso às redes sociais num momento em que a crise do estado levou o antigo caminho das urnas a um desmonte parcial. O governo eleito vem do “baixo clero”, sim, mas da mesma “nobreza” de detentores de privilégios em que o país continua dividido desde que foi arrancado de sua “americanidade” pela invasão do Rio de Janeiro pela corte portuguesa em 1808.
Tiradentes foi o último episódio realmente revolucionário do Brasil. Sendo a unica revolução real da humanidade a que decorre da “iluminação” proporcionada pela conquista da autonomia na busca da verdade que só a educação promove, a manutenção da sombra da ignorância é, como sempre foi, a arma essencial do status quo. Com o recrudescimento da censura, depois do enforcamento do alferes, a toda referência que não fosse européia que a Republica não conseguiu romper, quem sonha com mudanças no Brasil sonha com os efeitos de um processo cuja mecânica o país inteiro desconhece quase absolutamente, e que é fruto de uma tecnologia de construção de instituições cheias de sofisticadas sutilezas. É nisso que reside a nossa maior dificuldade. O que se pode reformar, para colher lá na frente esta ou aquela mudança real de rumo de uma sociedade, são as instituições. Mas muito maior que a dificuldade de saber como conseguir abrir a porta a mudanças tem sido a de formular quais mudanças, exatamente, é preciso fazer para colher a democratização que todos desejam.
A História tem seus caprichos. Bolsonaro não é a revolução mas chega no momento em que ela se tornou inevitavel. Uma vez no poder, deu-se conta, por meio de um eficiente trabalho intensivo de informação de sua equipe econômica, da urgência e da gravidade terminal da crise da previdência. Conduzido por ela, vai bater na barreira de sempre. O medo de cair no vácuo venezuelano levou a uma supervalorização da constituição antes da definição da sucessão pelas redes sociais. Mas o fato é que, na ausência do “direito divino”, ela foi transformada no congelador de privilégios da hora. E tem sido brandida como antes brandia-se a heresia para impedir avanços.
A verdade é a unica arma capaz de romper essa barreira. A reforma de Paulo Guedes, por mais próxima que chegue da profundidade com que foi desenhada, apenas abrirá a porta a um processo de ajustes permanentes em que o Brasil terá de se engajar daqui por diante, dadas as mudanças na duração da vida, nas relações de trabalho, nos costumes, em tudo, enfim, que até aqui descrevia a condição humana. A previdência, assim como tudo o mais na ordem institucional brasileira e mundial passa a ser um processo em permanente evolução que vai requerer retoques em velocidade alucinantemente crescente. Se nunca fez sentido enfiar privilégios previdenciários na constituição, portanto, agora faz menos ainda. Desconstitucionalizar a previdência é, portanto, um objetivo absolutamente prioritário.
A forma como a vida nacional já vem sendo decidida atraves das redes, contornando instituições esclerosadas, proporciona uma sensação de alívio neste primeiro momento de “vingança” dos “sem voz”, mas não passa de uma reprodução perigosamente tosca do que os suíços vêm praticando ha 729 anos e os americanos de lá importaram ha cerca de 120. Como toda ferramenta esse expediente serve, porém, a quem quer que recorra a ele, para o bem ou para o mal. O que tira desse sistema o seu potencial venenoso é a construção de um modelo confiavel de representação do país real no país oficial. Não ha mal nenhum em que o povo encurte os caminhos das suas relações com o governo desde que seja para REFORÇAR a representação aumentando o poder de cada representado sobre O SEU representante. Isso só se consegue com eleições distritais puras. Desde que se saiba exatamente qual representante representa cada conjunto de brasileiros, não ha mal nenhum, muito ao contrário, em que a relação entre eles seja a mais direta possivel, para fazer ou desfazer leis, para encurtar ou encompridar mandatos. Mas se esse encurtamento partir do governo, o resultado é opressão.
Nesse sentido, os Bolsonaro vêm “acertando no errado”, o que lhes tem rendido poder, aquela coisa que corrompe sempre e corrompe absolutamente quando é absoluto. Por isso é bom não esquecer jamais. Não existe democracia sem representação.
Na reforma da previdência de FHC, para manter os privilégios da nobreza(serviço público) impôs de maneira covarde o fator previdenciário.
Na época, apesar de todas as reclamações judiciais, foi considerada legal.
Agora, diante de todas as dificuldades impostas pelo corporativismo da nobreza, que fará de tudo para que a reforma não os atinja, essa ferramenta, fator previdenciário, deveria ser utilizada como lei ordinária,não havendo necessidade de uma PEC, como primeiro passo para solucionar o problema dos déficit previdenciários dos regimes próprios.
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A nobreza já reage à alterações em seus privilégios!
A CF não assinada pelos petistas, é erguida por esses mesmos para bradar pelos tais direitos adquiridos.
Continuamos vizinhos do destino da Venezuela: pontes que caem, criminalidade, serviços públicos péssimos.
Enquanto isso, os privilegiados fingem ser correto extrair riqueza com salário auto concedido.
Acreditam serem merecedores porque fizeram uma prova há anos, que lhes concedeu tal título.
Não conseguem raciocinar que o salário só pode ser pago pelo trabalho, e não por apropriação de cargo decorrente de provas antigas. Se assim fosse, passar no vestibular daria direito ao diploma final, sem precisar estudar.
Os nobres são os mesmos que não trabalharam a fim de coibir o crime organizado, totalmente incrustado em nosso país. Portanto, foram ineficientes.
Ainda acho mais fácil paralisarem o Governo, como feito com o anterior, para não passar a previdência.
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Penso que a reforma da previdência vai gerar credibilidade e abrir porta para as demais, igualmente necessárias. As duas principais, no meu entender, são o sistema distrital puro e a questão da dívida consolidada. O crescimento do Peru comprova o efeito da última e a estabilidade politica americana, a eficiência da primeira.
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Concordando com a opinião, acrescentaria a necessidade – a meu ver premente – da implantação de um verdadeiro federalismo, tanto político quanto tributário.
É importante nos darmos conta de que o cidadão nasce, se socializa, estuda, se forma, trabalha, produz, vive em coletividades, se diverte, pratica religião e esportes, se especializa, se aposenta e, finalmente, é enterrado… NUM MUNICÍPIO. Então, claro que é a este que se deve dirigir a maior parcela da carga tributária (hoje, menos de 10%).
Aos Estados, a segunda maior parcela (hoje, entre 20 e 30%), para que resolvam os problemas que dois ou mais municípios têm em comum, mas não conseguem enfrentar.
E à União a menor parcela – mesmo assim uma fortuna, pois oriunda de todos os 5560 municípios -, para que se ocupe apenas do que Estados e Municípios não tenham eficiência em enfrentar: FFAA, Itamaraty, PF, justiça constitucional, agências reguladoras, investimento nas unidades federativas menos desenvolvidas etc (hoje, a sua “mão grande” abocanha perto de 70% da carga tributária total do País).
E a representação política deve seguir o mesmo caminho, atendendo à proporcionalidade determinada na Constituição (e não cumprida, pois SP, com mais de 1/5 da população, devendo ter representantes nessa proporção, tem apenas 70 deputados; Estados pouco populosos tb fogem à proporção, ao ter “direito” ao mínimo de 8 deputados – total desproporção, em ambos os casos).
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O que acha da implementação do voto distrital misto previsto para as eleições de 2020? Alguma perspectiva de novas mudanças?
Resumo aqui:
“Sistema distrital misto já valerá para grandes cidades a partir de 2020
O substitutivo do deputado Vicente Candido (PT-SP) à Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 77/03 antecipa para 2020 a adoção do sistema eleitoral misto, mas apenas para as eleições nas cidades onde haverá segundo turno, ou seja, aquelas com mais de 200 mil habitantes, o que dá um total de 92 localidades.
“Estou propondo um modelo alternativo para 2018, que é longe do ideal; mas contando que a gente chega no modelo próximo do ideal a partir de 2020″, disse Candido.
Pelo sistema misto, metade dos eleitos virá da lista fechada; e a outra metade, do sistema distrital, que é majoritário (vence o candidato que levar o maior número de votos no distrito).
Para o deputado Marcelo Castro (PMDB-PI), autor da PEC 77 e relator de proposta da reforma política de 2015, o Congresso já amadureceu a discussão sobre a reforma política. “Acho que [o debate] está devidamente amadurecido. Acho que nós devemos parar de conversar, de discutir e votar.”
Sistema eleitoral
A partir das eleições gerais de 2022, o sistema distrital misto, modelo adotado na Alemanha, será a regra eleitoral para as eleições proporcionais, de deputados e vereadores. Apenas as cidades com menos de 200 mil habitantes adotarão o sistema de lista preordenada somente para eleição de vereadores.
Para as eleições de 2018, Candido resolveu manter o sistema proporcional atual ao invés de a lista preordenada pelos partidos, como tinha sugerido antes. Pelo modelo atual, são eleitos os que obtiverem mais votos dentro de uma combinação de votos próprios e da legenda.
Pela proposta, os distritos serão os mesmos tanto para deputados federais quanto estaduais. O texto também define a quantidade de deputados estaduais por distrito:
– três, em estados com até 12 deputados federais;
– dois, em estados com mais de 12 e até 24 deputados federais; e
– um, para estados com mais de 24 deputados estaduais.”
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Eu trabalho em um grupo que esta divulgando como funciona o sistema de eleições distrital puro com recall, veja como o sistema funciona no google e no site do jornalista senhor Fernão Lara Mesquita www,vespeiro.com , seja mais um brasileiro a ajudar o Brasil a se tornar um pais de primeiro mundo. Se esperarmos pelos políticos para que essa ferramenta seja implantada na nosso democracia, vamos esperar a vida inteira e o sistema não será implantado. chegou a hora de trabalhar na divulgação do sistema, para deixarmos um país muito melhor para nossos descendentes. Parabéns ao jornalista senhor Fernão Lara Mesquita, pelo belíssimo artigo divulgado no site.
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