Democracia: qual é a dos imbecis?
8 de setembro de 2022 § 2 Comentários

Estava programado e, depois das manifestações de ontem e a tentativa final de “tapetão” em curso, serve como um parêntese civilizatório…
Está encerrada a temporada de eleições primárias que movimentou o país inteiro nas quais os eleitores norte-americanos (e não os donos dos partidos ou os fabricantes de “regras do jogo”) escolheram no voto os candidatos com direito a concorrer à eleição final de 8 de novembro próximo.
Estarão em disputa entre os representantes de cada partido ou candidatos independentes escolhidos diretamente pelo povo as 435 cadeiras da Câmara dos Representantes do Congresso Nacional, 35 das 100 cadeiras do Senado Federal (inclusive a da vice-presidente Kamala Harris), os postos de governador de 39 estados (outros 11 fazem eleições em datas de sua escolha) e milhares de outros cargos dos poderes Executivo, Legislativo e Judiciário, dos membros dos school boards, encarregados de gerir cada escola pública de cada bairro do país, para cima.

Será também a primeira eleição depois do censo de 2020 que redesenhou os distritos eleitorais país afora. Não ha “falsas matemáticas” na democracia verdadeiramente representativa. Os estados e as parcelas menores da nacionalidade elegem um numero exatamente proporcional ao tamanho de suas populações versus o total representado em cada instância de governo em disputa. E, para cada uma, o direito de pedir votos na eleição pra valer é objeto de eleições primárias para a escolha dos candidatos diretamente pelo povo. Tudo passa por esses “dois turnos” em que só os eleitores têm voz.
A Califórnia, embora tendo perdido uma cadeira de sua delegação ao Congresso Nacional, que cai de 53 para 52 representantes em função da emigração para outros estados de uma parcela de sua população constatada pelo censo, continua tendo a maior bancada federal. Alem dos 52 federais, 80 deputados estaduais serão eleitos. E 20 das 40 cadeiras do senado estadual estarão em jogo.

No Executivo 12 altos cargos concorrem pelos eleitores. O governador Gavin Newson (D) que escapou de um recall no começo deste ano tenta a reeleição. Estarão em disputa por eleição direta também os cargos de vice-governador, promotor geral do estado, secretário de estado (encarregado de organizar “eleições especiais” como as de recall e outras), tesoureiro (fazenda), controller (aqui função dos perpétuos Tribunais de Contas nomeados pelos próprios “fiscalizados”), superintendente de educação pública, comissário de seguros (que fiscaliza a seguridade social) e quatro cadeiras da comissão estadual de equalização (um órgão que assessora o controle de contas públicas e as ações de assistência social).
Quais servidores públicos são diretamente eleitos e quais podem ser nomeados por governadores ou outros executivos é um assunto que os eleitores decidem aprovando leis de iniciativa popular. A lista pode ser infinitamente alterada “a gosto” da maioria dos “servidos”. E todos – seja os diretamente eleitos, sejam os seus nomeadores – estão permanentemente sujeitos a recall a qualquer momento.

No Judiciário, quatro dos sete juízes da Suprema Corte da Califórnia e 41 juizes das seis Cortes Estaduais de Apelação enfrentarão retention elections. Seus nomes estarão nas cédulas dos eleitores de suas comarcas com a pergunta “Fulano de Tal permanece juiz mais quatro anos”? “Sim” ou “não”.
Serão eleitos ainda centenas de representantes e funcionários municipais, a começar pelos membros dos 98 school boards do estado.
Sete medidas de alteração da constituição estadual (e centenas de outras de alcance municipal ou menos, cada qual votada só pelos eleitores de determinados distritos, o que se pode saber positivamente pelo endereço de cada um no sistema de voto distrital puro) também serão diretamente decididas em 8 de novembro, incluindo da Proposition 1 que restabelece o direito de aborto, à Proposition 30 que aumentará em 1,75 pontos percentuais, se for aprovada, o imposto de renda de pessoas físicas com renda superior a 2 milhões de dólares/ano para financiar os programas de banimento de carros a gasolina, passando pelas Proposition 26 e 27 que tratam de apostas esportivas online e em cassinos indígenas.

Praticando a democracia semi-direta ha quase um século e meio, o povo da Califórnia pode errar mas não tem compromisso com o erro: tem as leis e os impostos que quer ter, e altera essas decisões a cada dois anos ou menos se considerar urgente alguma de suas propostas. Somente entre 1985 e 2020, ele votou 395 referendos ou leis de iniciativa popular de alcance estadual (e milhares de outras de alcance local), das quais aprovou 228 (57,7%) e rejeitou 167 (42,3%).
Esse rápido exame do que é o verdadeiro deixa em carne viva a trapaça que é esse “estado democrático de direito” macaqueado pelos ditadores do STF que conhecem perfeitamente o que se descreveu acima e só ousam afirmar o seu “orgulho” da nossa falsificação que pode ser “aferida” em minutos e afrontar o povo brasileiro porque confiam cegamente no aplauso automático dos “imbecis” aos quais, mais que a internet, a imprensa que lhes bate bumbo faz questão de dar voz.

O maior de todos os negacionismos
19 de julho de 2022 § 9 Comentários

“A metafísica é um cego num quarto escuro procurando um gato preto que não está lá”. A frase é atribuída a Voltaire mas há controvérsias. No entanto ela me vem à cabeça a cada editorial, comentário ou “contras e a favores” que vejo ou leio na nossa imprensa a respeito da farsa política brasileira.
Estes dias li dois que eram sínteses desse desesperançado tatear de toda a mídia brasileira, sem nenhuma exceção à direita ou à esquerda. O primeiro culpava a sociedade brasileira por “não se assumir como a verdadeira responsável pelo seu próprio destino” e deixar-se embalar “pelo sebastianismo, essa eterna espera por um salvador que nunca chega”, num debate publico que “fica reduzido a nomes”.
Segunda-feira vinha outro para “refletir sobre a parcela de responsabilidade que recai sobre os próprios eleitores pela abissal distância que os separa dos seus representantes eleitos”, e a inutilidade do gesto desesperado deles (adjetivo meu) de querer sempre renovar o maior numero possível dos eleitos no pleito anterior.

Tanto as “escolhas” dos eleitores quanto a crescente rejeição dessas “escolhas” eram atribuídas à “falta de educação cívica de qualidade” e à “cultural propensão do eleitor brasileiro a escolher apaixonadamente entre nomes”, para a seguinte conclusão: “sem escolhas mais criteriosas … será muito difícil superar a crise de representação política que tantos males tem causado ao país”.
Mas que nível de “escolha” pode exercer o eleitor brasileiro no sistema eleitoral que temos? Nenhuma palavra sobre isso foi sequer de longe ameaçada em qualquer dos textos…
Nós não escolhemos os “nossos” partidos políticos. Qualquer meliante que se disponha a criar um do nada é financiado compulsoriamente por todo mundo que não o escolheu, sob os auspícios da Receita Federal. O Supremo Tribunal, que ninguém elegeu, pode inclusive “cancelar” ou cassar a palavra – e concretamente tem-no feito – a qualquer deles que denuncie o conflito desse desvio com a constituição que, diga-se de passagem, veda expressamente essa prerrogativa ao indigitado tribunal.
“Nossos” “partidos políticos” nascem e morrem, portanto, 100% à revelia dos eleitores.

Os candidatos escolhidos pelas criaturas dessas agremiações impostas é que são oferecidos à “escolha” do povo. As “escolhas”, portanto, não são dele, são “escolhas” dentro de escolhas alheias. O voto nos candidatos alheios, por outro lado, é obrigatório. A única “escolha” real que o povo tem é anular o seu, qual seja, imolar a sua cidadania em protesto, ou “escolher” um escolhido dos meliantes, com o altíssimo risco de eleger alguém cujo nome jamais conheceu pois no nosso “sistema proporcional” somente 15% dos eleitos tiveram votos em seus nomes, 85% o foram de carona pelo voto partidário que o voto nominal incluiu à revelia do eleitor.
Pelos quatro anos seguintes – com muitos desses privilégios se tornando automaticamente vitalícios e alguns hereditários não por “escolha” do povo mas por escolha dos compulsoriamente “escolhidos” para ele – essas auto-qualificadas “excelências” (existe adjetivo menos democrático?) são intocáveis, seja qual for o crime cometido. E os juízes que ousarem aplicar a eles a lei que eles próprios escrevem ficam sujeitos a linchamento moral e até a pena de prisão…
Mas em nada disso esbarrou o nosso articulista arquetípico do atual jornalismo brasileiro na sua tateada meditação. A culpa pelo envenenamento é do envenenado e não do envenenador.
E no entanto, a um click de distância na internet, ou a poucas horas de vôo mesmo para quem ainda perde tempo com o mundo físico, está a outra América, que começou junto com a nossa e hoje está a 25 vezes o nosso PIB de distância da nossa miséria.

O que foi que eles descobriram que nós ainda não sabemos? O que foi que eles inventaram?
Rigorosamente nada!
Quem já viveu o pouco que é necessário para entender que nossa espécie, quando trabalha, trabalha para quem tem o poder de demiti-la, já não tem desculpa para não entender a essência da mecânica de qualquer sistema realista de representação.
Como transformar essa verdade elementar num sistema de organização social democrático que custou à humanidade milênios de sangue, suor e lágrimas, também é obra feita. Deixar de copiá-la, como têm feito os americanos do norte e todos os povos que se salvaram da miséria, é tão imperdoável quanto soprar fumaças no rosto em vez de tratar doentes de infecção com antibióticos ou combater epidemias com sacrifícios de criancinhas aos deuses em vez de vacinas em pleno 3º Milênio, só porque nenhuma das duas são obras domésticas.

Quem matou a charada foram os suíços, o único povo que nunca teve um rei: “é o contrario, cara-pálida; é o povo que tem de educar o governo e não o governo ao povo”.
Os direitos de iniciativa popular e de referendo de leis foram sistematizados nos cantões (estados) suíços na constituição de 1848 e estendidos ao nível federal nas reformas de 1874 e 1891:
- Todas as questões de importância passaram a ser “constitucionais” e decididas diretamente pela maioria do povo (um voto por pessoa) e dos cantões (um voto por estado) membros da federação, em referendos obrigatórios, seja de propostas dos legislativos, seja de propostas de iniciativa popular.
- As questões de importância secundária objeto de leis ou regulamentos ordinários, são decididas pelos parlamentos, reservado o direito do povo de desafiá-las em referendos opcionais.
O resumo é que nem todas as decisões começam pelo povo, mas elas SEMPRE acabam nele, que tem SEMPRE a última palavra.

A Suprema Corte Federal suíça NÃO TEM o poder de anular leis federais porque todas elas, ou foram propostas e aprovadas, ou foram confirmadas em referendo diretamente pelo povo do qual realmente “EMANA TODO O PODER”.
Isso ensinou os governos a negociar cada um de seus passos e aparar cada aresta de suas propostas, sob pena de ser empurrado de volta para trás.
O resto é tapeação. Essa é a diferença que faz a democracia suíça muito superior até à americana, e do ”estado democrático de direito” brasileiro uma piada triste de gente primitiva quando não uma falsificação deliberada de golpistas.
Os americanos copiaram os suíços na primeira grande crise de sua receita de democracia para países do tamanho do Brasil na virada do século 19 para o 20, deixando fora do controle direto do povo apenas as leis federais, o que, mesmo assim, fez deles a maior potência que a humanidade já viu.
Muitos outros povos os seguiram. O resultado é tão fulminante para quem adota – as sociedades mais ricas e bem educadas do mundo (o que é consequência e não causa da adoção) – quanto para quem não adota (as mais miseráveis e oprimidas, como a brasileira), ficando pelo meio da escala quem adota apenas pedaços da receita.
O Brasil já está grandinho para andar com as próprias pernas. Nada mais, nos dias que correm, justifica negar a existência da única solução que funciona.

Eleições democráticas x eleições brasileiras – 1
23 de junho de 2022 § 13 Comentários

1212 candidatos à presidência da república dos Estados Unidos inscreveram-se na Comissão Federal de Eleições (FEC) para a disputa de 2020. 323 candidataram-se pelo Partido Democrata (D), 164 pelo Republicano (R), 65 pelo Partido Libertário (L), 23 pelo Partido Verde (V) e os demais por algum dos 420 partidos políticos registrados no país ou como “independentes”.
Para ser candidato a presidente dos Estados Unidos não é preciso pedir ordem a ninguém, salvo os eleitores/contribuintes das campanhas. Tudo que é exigido é que seja alguém nascido no país, com mais de 35 anos e nele residente ha pelo menos 14. O candidato pode declarar-se como tal quando quiser mas depois que tiver recebido US$ 5 mil em contribuições ou gasto um valor acima desse montante em sua campanha fica obrigado a registrar-se na FEC no prazo de 15 dias.
Só a sociedade civil, por seus indivíduos ou instituições, pode financiar esses partidos e/ou campanhas. Os candidatos são obrigados a prestar contas minuciosas do quanto receberam de quem ANTES das votações decisivas, seja das primárias cuja etapa final para a eleição de novembro esta ocorrendo agora, seja das eleições finais. É esta a principal e quase única função da FEC, constituída por cinco gatos pingados. Cabe ao eleitor decidir quais doações comprometem quais candidatos e votar de acordo com sua conclusão.

Os passos seguintes variam de estado para estado e de partido para partido, com diferenças até, dentro do mesmo partido, de estado para estado. Cada um estabelece suas nuances no modo de pedir ou exigir dos eleitores o endosso a cada candidato nas sucessivas etapas das eleições primárias, com alterações que têm, como objetivo precípuo, eliminar a interferência dos “donos” dos partidos e concentrar a escolha cada vez mais diretamente nos eleitores.
No final do processo, quatro candidatos se tinham qualificado para disputar a maioria acima de 270 votos do colégio eleitoral: Donald Trump (R), Joe Biden (D), Howie Hawkins (V) e Jo Jorgensen (L). Sete outros cumpriram os requisitos para ter seu nome impresso nas cédulas de cinco estados ou mais. Nas cédulas de Vermont e Colorado estavam impressos os nomes de 21 candidatos a presidente cada. Arkansas e Louisiana vinham em segundo lugar com 13 candidatos nas cédulas. 12 estados tinham só três candidatos inscritos no quesito “Presidente da Republica”.
Além dos demais membros do Executivo e do Legislativo, os americanos elegem diretamente (e, dos estados para baixo, têm o poder de “deseleger” a qualquer momento por recall) também todos os funcionários públicos com funções específicas de fiscalização do governo, prestação de justiça e responsáveis pela educação pública tais como promotores, juizes, chefes de polícia, fiscais de contas públicas, membros dos conselhos de pais que mandam nas escolas públicas e outros, sempre seguindo essa mesma orientação geral de “derrubar as porteiras” de entrada e deixar para os eleitores – e não para os partidos e nem muito menos para os “nomeadores” – a decisão final de quem vai chegar à reta final com direito a pedir um voto decisivo ao conjunto dos eleitores.

A lista dos funcionários a serem diretamente eleitos ou que podem ser nomeados, seja por alguém, seja por bancas também eleitas especificamente criadas para esse fim, muda constantemente ao sabor de leis de iniciativa popular que os eleitores refazem livremente a cada eleição. Cada cidade decide a sua.
Acompanha esse poder de propor leis que os legislativos são obrigados a tragar exatamente como lhes chegarem dos eleitores a menos que violem algum dos direitos fundamentais que constam da constituição federal, alem do poder de retomar a qualquer momento os mandatos de todos eles por qualquer razão que lhes der na telha, também o de rejeitar, pela convocação de um referendo, qualquer lei que os legislativos atirem sobre suas cabeças. São eles que têm a palavra final SEMPRE e EM TUDO, exceto nas leis e nos cargos federais cujo alcance é estritamente limitado a uns poucos assuntos.
Todos esses mecanismos os americanos copiaram da democracia suíça, a mais antiga do mundo moderno, vigendo desde 1290. Cometeram o erro de não estender esses poderes dos eleitores também à esfera federal, como têm os suíços, que podem propor alterações até na própria constituição a serem submetidas ao resto do eleitorado colhendo umas poucas assinaturas. Esse direito os americanos têm somente quanto às constituições estaduais e municipais, onde está inscrito tudo que extrapola os poucos direitos “imexíveis” enumerados na constituição federal.

Os suíços, o único povo que jamais teve um rei em toda a sua história, convencidos pela longa experiência comum a todos nós de que a vaidade é o pecado preferido do diabo, aboliram até mesmo a figura do presidente da república. Elegem um board de cinco membros para fazer as funções que fora de lá ficam nas mãos de um único homem, deixando o resto da população refém do seu ego. Os americanos, por enquanto, só aboliram os prefeitos, trocando por boards à la Suíça os da maioria das suas cidades.
Democracia, nunca é demais repetir, não é um lugar definido de destino, é só um manual de regras de navegação.
Daí a americana, criada declaradamente para extinguir o sistema de privilégios “absolutos” que prevalecera até então, “fechar-se” no menor número possível de balizas deixando tudo o mais em aberto para evoluir, dócil às circunstâncias, na base do ensaio e erro.
Nesse sentido vem perfeitamente a calhar o radical federalismo americano, também copiado dos suíços.

Fora o pouco que está “congelado” na constituição federal – os direitos fundamentais à vida, à intocabilidade do que vai pelo pensamento e pelo coração e se expressa na fé e nas palavras de cada pessoa, à intocabilidade da propriedade amealhada com trabalho e dos instrumentos de defesa desses direitos fundamentais especificados nas 8 primeiras emendas à constituição federal e mais as regras do jogo do sistema dos três poderes independentes e harmônicos que “emanam” (pelo voto e só pelo voto) diretamente do povo – cada parcela desse povo nos estados e mesmo nas cidades ou nas comunidades ainda menores tem o direito e o poder de modificar (pelo voto e só pelo voto) toda as outras regras.
Assim, da próxima vez que você se sentir tentado a chutar o povo brasileiro que “não sabe votar” e “escolhe as pessoas erradas”, lembre-se que a nossa “democracia” é uma falsificação grosseira que não nos dá o direito de escolher coisa nenhuma, senão dentro das escolhas da bandidagem que, desde 1500, continua lá, trancada no poder, e vá tratar de lutar para que a verdadeira afinal seja instalada entre nós.

Quão longe você está da democracia? – Final
24 de maio de 2022 § 7 Comentários

O único elemento inegociável da democracia americana, que vem imposta por “We, the people” (“Nós, o povo”), é fazer valer o poder de quem assina a constituição que a institui.
Respeitados o direito à vida, às crenças e à liberdade de expressão dessas crenças e à propriedade privada daquilo que cada um conseguir amealhar com trabalho, e mais os oito direitos diretamente decorrentes desses três especificados nas primeiras emendas à Constituição Federal, tudo o mais é permitido ao povo americano, menos atentar contra o regime dos três poderes independentes e harmônicos eleitos para exercer o poder em seu nome.
Ele pode e deve escrever e reescrever as constituições e as leis estaduais e municipais subordinadas à federal quando, como e quantas vezes quiser para adaptá-las às circunstâncias de cada momento e favorecer “a busca da felicidade” por cada indivíduo exatamente do jeito que bem entender.
Cabe à Suprema Corte exclusivamente conferir se cada lei, venha de onde vier, está de acordo com o que está escrito nos 7 artigos e 28 emendas da Constituição Federal, e a ninguém ocorre a hipótese de qualquer de seus juízes avançar um milímetro além desse limite. O povo, diretamente, e não os seus representantes ou os próprios tribunais, tem todas as armas necessárias para torna-la impensável.

Cientes de que a “petrificação” de qualquer norma que não seja a que define o regime, “a regra do jogo”, não faz qualquer sentido numa realidade cambiante senão para a defesa de privilégios, essa é uma tarefa do conjunto da sociedade que, em tudo o mais, avança por ensaio e erro, sem compromisso com o erro.
A democracia não é um “local de destino” definido. É uma norma de navegação…
É por isso que todas as instâncias de governo contam com um Secretário de Estado, funcionário cuja atribuição exclusiva é organizar e zelar pela legitimidade das “special elections” (“votações“) que lá acontecem a toda hora para eleger e des-eleger representantes do povo, recolher as sugestões de cada cidadão e submete-las aos seus pares para que, pelo critério de maioria, o único que não é passível de “interpretações” distorsivas, decidam o destino de cada uma.
E, sendo assim, todo o sistema está aparelhado para que ninguém hesite em ensaiar e errar, desde que fique garantido que os direitos fundamentais de cada um serão respeitados e todos terão condições de participar conscientemente dessa obra coletiva.
Essas sugestões dos cidadãos têm de ser expressas num nível de vocabulário acessível a todos (e esse nível é definido tecnicamente em padrões que podem ser aferidos), resumidas a um tamanho máximo, acompanhadas de argumentações contra e a favor, e então submetidas a voto.

As aprovadas viram lei até decisão em contrário e, em todos os casos controversos, deve prevalecer a decisão expressa no voto diretamente pelos representados e não pelos seus representantes eleitos ou, muito menos, por funcionários não eleitos, com ou sem a cabeça raspada, qualquer que seja a sua graduação.
Abaixo, segue o último trecho da lista das ballot measures de alcance etadaual (questões de inciativa popular ou de iniciativa dos legislativos a serem decididas diretamente no voto) já aprovadas para constar das cédulas das eleições de novembro próximo. Ao lado delas também estarão nas cédulas dezenas de outras de alcance municipal ou apenas distrital:
New York
- Emite US$ 3 bilhões em títulos para financiar projetos ambientais, de recursos naturais, infraestrutura de água e mitigação das mudanças climáticas.
Oregon
- Emenda a constituição para fazer constar que o estado “garante que todo residente tenha acesso a tratamento de saúde clinicamente apropriado por um preço justo como um direito fundamental”.
- Repele expressões que admitam a escravidão ou a servidão involuntária como punição de crimes e autoriza as cortes estaduais ou uma agência de condicional a prover penas alternativas à de prisão.

South Dakota
- Estabelece maioria de 3/5 para a provação de emendas constitucionais ou leis de alcance estadual de iniciativa popular, de iniciativa legislativa ou que decorram de referendo que aumentem impostos ou taxas e impliquem crescimento de arrecadação acima de US$ 10 milhões ou mais a cada 5 exercícios fiscais.
- Emenda a constituição para estender os benefícios do Medicaid para adultos entre 18 e 65 anos com rendas inferiores a 133% do limite oficial de pobreza estabelecido na lei federal.
Tennessee
- Torna ilegal a exigência de sindicalização como condição de contratação.
- Revoga normas que admitiam escravidão ou o trabalho involuntário como penas para criminosos.
- Prescreve o modelo de processo e estabelece a linha de sucessão para governadores.
- Elimina a disposição constitucional que desqualifica padres e pastores religiosos para a eleição para o Legislativo.

Texas
- Autoriza o Legislativo a reduzir o valor da limitação do imposto sobre residências de idosos ou portadores de deficiências para a manutenção de escolas.
- Aumenta o limite de isenção de impostos sobre residências em cada distrito escolar de US$ 25 mil para US$ 40 mil
Utah
- Aumenta os quóruns para a convocação de sessões especiais do legislativo e isenta de limites para arrecadação e gasto de fundos de emergência federais.
Vermont
- Proíbe a escravidão e os trabalhos forçados como pena.
- Estabelece o direito constitucional à autonomia reprodutiva de cada indivíduo.

West Virgínia
- Estabelece que nenhuma corte de justiça tem qualquer autoridade em processo de impeachment e que os julgamentos de impeachment pelo Senado não podem ser revistos pelas cortes estaduais.
- Autoriza a incorporação de denominações religiosas e igrejas.
- Autoriza o legislativo estadual a isentar de impostos maquinas, equipamentos e outros bem pessoais usados em seus negócios.
- Requer das comissões de educação que submetam suas decisões à aprovação, emenda ou rejeição do Legislativo.
Wyoming
- Autoriza os governo locais a investir em ações e equity quando houver decisão do Legislativo estadual por maioria de ⅔.
- Aumenta o limite de idade para aposentadoria de juizes da suprema corte estadual e das cortes distritais de 70 para 75 anos.

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