Qual a gravidade da doença americana?
16 de abril de 2021 § 8 Comentários

A Hollywood, as universidades e a imprensa americanas hoje tomadas por artistas e intelectuais “orgânicos” agentes da “hegemonia cultural” segundo a receita de Antonio Gramsci são consequência e não causa da decadência da democracia americana.
Para além da proposição teórica e do “Bill of Rights” acoplado à constituição, os direitos fundamentais que definem a democracia americana – como de resto em toda parte – só podem ser exercidos num ambiente onde o cidadão pode fazer escolhas nas dimensões mais concretas da sua vida, quais sejam, as de trabalhador e consumidor. Diante de um patrão ou de um fornecedor únicos, em condições, portanto, de dar-lhe pena de morte econômica, para ser curto e grosso, nenhum outro dos seus direitos permanece em pé.
O socialismo foi barrado na entrada dos Estados Unidos ao longo de todo o século 20 pela forte adesão do povo ao capitalismo domesticado pelo viés antitruste que Theodore Roosevelt imprimiu à democracia americana na virada do século 19 para o 20. Ao eleger a preservação de um limite mínimo de concorrência como limite máximo da competição econômica, TR deslocou o foco do capitalismo americano da finalidade única de enriquecer ilimitadamente empreendedores (e acionistas) para o de garantir o direito do cidadão comum, proletário, de ser disputado, enquanto trabalhador pela oferta de salários crescentes e enquanto consumidor pela oferta de preços decrescentes pelos empreendedores, deixando a inovação tecnológica como a única porta aberta para o crescimento econômico para além do limite de ocupação de mercado estabelecido.

Isso, pela primeira vez na história da humanidade, proporcionou a umas tantas gerações de americanos “vencer na vida”, em ascensão continuada, cada geração conquistando mais em matéria de afluência e bem estar social que a anterior, exclusivamente pelo trabalho, sem ter de pedir nem fazer favores a ninguém, com a melhor distribuição de renda jamais alcançada, num processo virtuoso que arrastou o resto da humanidade atras de si na maior onda de prosperidade com liberdade e conquistas científicas e tecnológicas jamais vividas por nossa espécie.
Com o advento da internet e o início da competição com os preços vis do “capitalismo de estado” chinês (o novo nome do socialismo onde todos os meios de produção pertencem a um único dono), os Estados Unidos e o resto do Ocidente democrático entraram, no entanto, em pânico. Em vez de impor aos chineses uma competição em termos civilizatórios pelos mercados que os chineses mesmo não tinham, cobrando impostos para a entrada no seu de bens com patentes roubadas e feitos com mão de obra semi-escrava sem direitos trabalhistas, aceitaram a briga nos termos deles.
Derrubaram todo o aparato antitruste que pela única vez na história de fato “levou a classe operária ao paraíso” e, para enfrentar os monopólios estatais chineses correram de volta para os monopólios privados que TR tinha banido, uma absoluta “roubada” pois está claro que nem as Exxon’s da vida poderão enfrentar seus equivalentes chineses que podem prosseguir operando indefinidamente com prejuízos, ainda que isso leve algumas centenas de milhões de súditos do partido único, dono de tudo, a comer morcegos por algum tempo mais do que ja estão acostumados.

Os “ganhos de escala” com esse retrocesso são obtidos, ou diretamente, como foi o caso da Apple e tantos outros “gigantes” ocidentais que foram explorar trabalho infantil e salários de fome na própria China, ou indiretamente, nos próprios Estados Unidos, com o sucessivo “achinezamento” dos salários que sobrevivem ao massacre de empregos que custa essa estratégia tão burra quanto covarde.
Agora, depois do empobrecimento geral e de instalado o crescente descontentamento com a desigualdade de renda que abriu o país ao canto de sereia socialista, coroam a obra deletéria com programas maciços de distribuição de dinheiro impossíveis de reverter num país cujos governos precisam ser eleitos, para que os “novos pobres” criados por 40 anos seguidos de recordes sucessivos de fusões e aquisições, ou seja, 40 anos seguidos de corrida de volta para os monopólios privados … comprem cada vez mais bugigangas baratas dos monopólios estatais chineses.
Antes de completar 100 dias o governo de Joe Biden aprovou num congresso encurralado pela pandemia US$ 1,5 trilhão em assistência direta “à pobreza”. Com US$ 1.400 por pessoa, uma família de casal com dois filhos passa a receber do Estado, para não fazer nada, US$ 5.600 por mês, valor a que muito pouco “rico” do 3º Mundo tem acesso. Só a sociedade americana, a única que chegou ate aqui livre da praga do suborno eleitoral em massa institucionalizado, não sabe que isso é irreversível…

E agora o provecto Biden, mais um desses governantes de hoje que não precisam “ser nada” porque foram eleitos justamente pelo que não são, quer mais US$ 2,5 trilhões de investimentos do governo federal em “obras de infraestrutura”, sendo que crianças, idosos e portadores de deficiências passam a ser definidos como “infraestrutura”…
Essa “inovação conceitual” com sabor de STF brasileiro, se passar, mata o mais sólido elemento do famigerado “excepcionalismo americano”. O que colocou os Estados Unidos a anos luz de distância do 2º colocado em todos os indicadores de afluência e progresso foi a diferença que fazem entre “direitos negativos” – tudo que o Estado não pode fazer e estão reservados à constituição federal, instância em que não vigoram os direitos de recall, referendo e iniciativa – e “direitos positivos” – todos aqueles, tais como os a um determinado padrão de serviço de saude, moradia, educação, etc., que requerem aportes de dinheiro de terceiras pessoas para serem desfrutados por quem os adquirir.
Como na base dos “direitos negativos” está a interdição absoluta ao Estado de dispor da propriedade privada dos indivíduos, todo “direito positivo”, lá, fica relegado às constituições estaduais e municipais, instâncias onde vigoram os direitos de recall, referendo e inciativa, e só pode ser instituído com a anuência, no voto, por quem vai ser chamado a pagar a conta.
É este, em resumo, o maior de todos os direitos em uma democracia, que fez dos Estados Unidos o que eles se tornaram: o do próprio povo, e não o Estado à revelia dele, decidir caso a caso o que cada um concorda ou não em dar aos outros. E é sobre este que o governo federal, sob Joe Biden, está estendendo as suas garras.

Perfeito e assustador. Os donos do poder financeiro, a meu ver, estão em conluio com a China para ganhar mais e por mais tempo. É óbvio que não pensam no povo em achinesamento.
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Contribuo para esta discussão referindo o interessante livro “Por que não houve socialismo na América? ” de Seymour Martin Lipset e Gary Marks
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Muito lúcido e verdadeiro. Pena ninguém na nossa chamada grande imprensa enxergar esses fatos, ou, pelo menos, ter a disposição de veicular…
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Richard Nixon, advogado a serviço do grande capital americano, foi mandado à China em busca de mão-de-obra semi-escrava que multiplicaria os lucros já então fabulosos. Foi muito bem recebido pelo genial sucessor de Mao, Chi Ji Ping e em poucas décadas chegou ao topo do mundo. Desemprego e baixos salários fizeram a economia americana declinar. Mais: Biden está inflacionando com esses planos de trilhões de dólares. Por fim: a China detém a maior reserva de dólares do planeta. Se quiser derrubar o padrão dólar mundial, lhe bastará pôr à venda essa montanha de dinheiro americano! Grandes players, grandes jogadas!
Jayme Cueva
Lucros
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Ótima análise. Obrigado.
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Parece óbvio que em cada canto do planeta Terra existem pessoas e grupos de pessoas organizadas para praticar o bem e o mal em relação àquilo que se espera de uma sociedade humana esclarecida. Muita coisa corre por baixo de máscaras, cortinas de fumaça e falsidade pseudo-diplomática que satisfazem somente ao ego de facínoras, escravagistas e exploradores das massas humanas das quais sugam-lhes o sangue, o suor e a alma. É assim desde antes que o homem começou a perceber que poderia tirar vantagens dos menos afortunados em número de neurônios ou dos que se contentavam com uma vida mais simples e natural. Não tem problema não, Marte é logo ali em nosso sitema solar…
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Fernão e vespas, agora indo mais direto ao cerne do artigo,penso que Biden está querendo primeiro recuperar a grande massa de desempregados, num processo de reinclusão deles na economia e propiciando aumento do consumo, ativando o comércio, que impulsionará a indústria americana que já quebrou a cara com decisões erradas no passado recente, desmontando na economia o que Teodore Roosevelt legou aos americanos com sua política anti-truste.
Ao mesmo tempo o presidente de fato, cidadão preparado e vivido, Joe Biden dará início a projetos de crescimento da indústria americana, porque trouxa ele não é – mesmo sendo octogenário, e ainda bem que o é, pois de mocinhos muito incompetentes na política estamos todos de embornal repleto, aqui e lá também – e dizendo, como já está, o que os chineses devem observar para serem participes de um mundo melhor para todos, com respeito às leis e acordos internacionais – mormente os de patentes – evitando confrontos contraprodutivos para todos em tempos de pandemia de coronavirus, esta uma violência sem fim previsto e que ceifará milhões de vidas, sem que haja um único tiro ou míssil envolvido.
Não é somente com uma tremenda poupança com trilhões de dóllares que a China pode ditar o que quer ao mundo com violência econômica, e disso os impérios romanos já experimentaram faz tempo, e sumiram. Do confronto interno chinês, entre a China continental e a insular, entre uigures e outros grupos descontentes versus governo central, pode estar o calcanhar de Aquiles, a fragmentação.
Onde está a ‘Cortina de Ferro” que separava a Europa do oriente da ocidental, isolando a União da Repúblicas (“democráticas”) Socialistas Soviéticas da “decadência do capitalismo ocidental?
Cadê o regime cubano dos Castros hereditários sanguíneos que mantém o povo num miserê de dar dó?
Prefiro aguardar as cartas do presidente Joe Biden ao mundo civilizado.
Seu texto é muito pertinente, mas um retrato de um momento que, nos EUA poderá mudar. Espero.
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Goodd read
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