Quem luta por Cesare Battisti

14 de setembro de 2009 § 5 Comentários

Afinal, porque o destino de um assassino italiano preocupa tanto o nosso ministro da Justiça? E porque o PSOL, da candidata Heloisa Helena, se mobiliza para garantir a sua impunidade? Quem é Achille Lollo, que ela e a filha do ministro Tarso Genro tratam como guru? O que este caso revela a respeito das pessoas que nos governam?

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As circunstâncias que cercam o julgamento do pedido de extradição de Cesare Battisti, que matou duas pessoas, aleijou uma criança (veja o vídeo com entrevista da vítima) e mandou matar mais duas na Italia nos anos de 1978 e 1979 dá uma boa medida da gente que nos governa e permite vislumbrar a herança que vão nos deixar.

Os sucessivos atropelamentos de Lula pelo seu ministro da Justiça, que o presidente, aliás, faz questão de não registrar, nos dão um testemunho eloquente das mazelas do Poder Executivo que, salvo em questões que possam render algum dividendo eleitoral imediato, oscila entre a omissão do presidente e as manifestações voluntaristas e caóticas do bando heterogeneo que ele enfiou em tantos ministérios quantos são os guichês abertos na feira livre dos “partidos” que vendem “governabilidade” em troca de cargos publicos e as subtribos do petismo e do sindicalismo pelego que nele se abrigam.

O cinismo pragmático de Lula jogou o comércio político brasiliense para um patamar de onde será dificil descer de volta. Como na Natureza, os espécimes da fauna planaltina tambem proliferam em função da oferta de comida. No universo do Estado brasileiro, regido pelos princípios da vitaliciedade dos “direitos adquiridos”, entretanto, esta é uma via de mão unica. As novas bocas chegam para ficar. Assim, é provavel que não nos livremos mais de pagar por dois governos distintos, um composto pelos ministérios a que o presidente dedica alguma atenção, como o da Fazenda e o das Minas e Energia, e o outro loteado entre aqueles dentro dos quais a cachorrada briga como quer, sob a mais completa indiferença de sua excelência.

Assim, tudo indica que o melhor com que poderá sonhar o eleitor brasileiro daqui por diante é que os futuros presidentes venham a incluir na lista dos que merecem atenção alguns dos desprezados de hoje, em especial os ministérios encarregados das funções clássicas do Estado que encontram pares nos paises civilizados como o da Educação, o da Saude e o da Justiça, entre outros.

Tarso Genro

Seja como for, o empenho do sr. Tarso Genro pela libertação de Battisti, posto ao lado do ato que o precedeu de poucos meses que foi a extradição forçada, executada às pressas numa operação quase clandestina, dos dois lutadores cubanos que pediram asilo ao Brasil para escapar à sanha de Fidel Castro, define o seu grau de apreço pela idéia de Justiça. Assim como o cotejamento dos argumentos por ele usados para justificar suas atitudes num caso e no outro, quase identicos, apenas com sinal invertido, fala-nos do seu entendimento do que seja democracia. Quanto à sua noção de legalidade, fica definida pela sua insistência em navegar sempre na contra-mão do Conselho Nacional de Refugiados, o órgão formalmente encarregado desses casos, prendendo quem ele manda soltar, e soltando quem ele manda prender…

Por enquanto, portanto, o caso Battisti já serviu para confirmar que, para o nosso pragmático presidente, o Ministério da Justiça não tem função maior que a de servir como um cala a boca para a ala esquerda do PT, da qual é um procer ilustre o sr. Tarso Genro.

De sua parte, o ministro agraciado, que faz questão de declarar todos os dias o seu descompromisso com a legalidade e a noção de justiça usando silogismos tão cínicos quanto agressivamente falsos para justificar seus atos,  nos dá provas repetidas de que não se sente representante de nada nem de ninguem. O sr. Tarso Genro apenas manda como quer. E quando lhe apraz, atiça sua polícia para cima de quem não obedece. É tudo…

Já dos traços mais intimos do seu carater, fala-nos o caso que ele julgou, à revelia das leis e dos tribunais.

Os fatos são simples. Embora a Italia vivesse, nos anos 70 como hoje, na plenitude democrática e o Partido Comunista Italiano tivesse grande força política e importante representação no Parlamento da época, Battisti e seus companheiros não estavam satisfeitos. Não queriam disputar o poder por canais “burgueses” como partidos e eleições. Queriam tomá-lo pela força. Para isso, fundaram o grupo Proletários Armados pelo Comunismo (PAC) que, para “fazer-se ouvir”, usava o sangue alheio, derramado em atentados e assassinatos.

Em junho de 1978, o grupo de Battisti matou o policial Antonio Santoro. No dia 16 de fevereiro de 1979, Battisti matou pessoalmente, em locais diferentes de Milão, o açougueiro Lino Sabaddin e o joalheiro Pier Luiggi Torregiani. Este andava na rua com seu filho Alberto, então com 15 anos,  quando foi assassinado a tiros. Ao lado do pai, a criança tambem foi atingida e, desde então, vive numa cadeira de rodas. Não foi ouvido pela imprensa brasileira desde que começou o imbroglio Battisti por falta de vontade dos responsaveis pelas nossas redações que, sem exceções, sabem da sua existência e da sua luta por justiça. Eis o que ele tem a dizer, em entrevista disponivel na internet, embora, lamentavelmente, sem versão legendada em português:

Torregiani e Sabaddin não tinham qualquer militancia ou envolvimento com política. Foram condenados à morte porque estavam num restaurante assaltado por membros do PAC e reagiram, o que levou os assaltantes à prisão.

Em 16 de abril desse mesmo ano,  foi executado Alberto Campagna na cidade de Mestre, proxima a Veneza.

Em 1981 Battisti foi preso, acusado dos quatro assassinatos. Antes que o julgamento começasse, fugiu da prisão. Foi para a França, onde recebeu proteção pessoal de Ives Cochet, lider do Partido Verde francês. A Corte de Diretos Humanos da União Européia entendeu que, ao fugir, Battisti tinha renunciado ao direito de ser julgado estando presente. E assim, foi julgado à revelia e condeando a 30 anos de prisão.

Quando percebeu que poderia ser extraditado, fugiu para o Brasil. Em 2007, uma policial francesa atraiu-o para uma cilada e ele finalmente foi preso, em Copacabana.

A Italia, governada por uma coalisão de centro-esquerda, pediu então a extradição de Battisti com o apouio de todos os partidos de esquerda com exceção da pequena agremiação radical Refundação Comunista que não nega as culpas de Battisti mas defende a concessão de uma anistia. Aprovado pelo Conselho Nacional de Refugiados (Conare), o pedido estava para ser atendido quando o insigne ministro Tarso Genro, num ato voluntarista, intercedeu em seu favor antes de falar com o governo brasileiro, suspendendo a extradição sob a alegação de que se trata de um “perseguido político” que teria sido “condenado à revelia nos porões de uma ditadura” em função de maquinações de “forças ocultas de um aparelho estatal”. Com essa atitude, desqualificou, de um só golpe, alem do Conare, a democracia italiana e a Corte de Direitos Humanos da União Européia.

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Lula, como sempre, preferiu se omitir…

Agora, passados dois anos de água fria na fervura, bem ao estilo do nosso presidente que teme mais que tudo as alas radicais do seu próprio partido que sempre desafiaram sua liderança sobre o PT, o caso chega ao STF onde, pasados seis anos de mandato de Lula e quatro nomeações suas de ministros do Supremo, já é possivel ouvir, na corte suprema da Nação, votos como o que o ministro Joaquim Barbosa deu a favor de Battisti, tentando estabelecer que “o ato de concessão de refugio é um ato de soberania do Estado que concede refugio” e, como tal, não é da conta do STF.

Resta esperar que sua excelência não faça jurisprudência, o que poria um fim à democracia brasileira. Voltaríamos diretamente para a monarquia absolutista, onde os atos dos governantes são assunto a ser tratado somente entre eles e Deus…

Seja como for, as circunstancias do julgamento nos permitem, antes mesmo que ele chegue ao fim, avaliar a extensão da subversão de principios promovida pelo lulismo.

Assistiram ao julgamento para garantir “justiça” a Battisti o senador Suplicy, aquele que reage pavlovianamente a qualquer criminoso estrangeiro preso no Brasil, em cujo gabinete dormiram, na véspera, uma duzia de “manifestantes espontaneos” que invadiram o plenário do STF gritando slogans pela libertação de Battisti, e mais o senador Jose Nery, do PSOL, os deputados Ivan Valente e Chico Alencar, do mesmo partido, e o deputado Jair Bolsonaro.

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A certa altura, houve um bate-boca entre Bolsonaro e o senador Nery. Bolsonaro lembrou que os crimes de Battisti nunca poderiam ser considerados crimes políticos uma vez que ele matou por vingança cidadãos comuns que tinham reagido a um assalto. Ao que Nery respondeu, simplesmente, que os assassinados eram “militantes fascistas”.

Este episódio fortuito vem dar acabamento ao principio de Justiça que nosso ministro esboçou ao dar tratamentos avessos ao caso dos refugiados cubanos e ao de Battisti. Nery formulou com todas as letras aquilo que o ministro não chegou a dizer, ouseja, que matar “militante fascista” póóóódi…

Mas isso não é tudo. Se ainda houvesse jornalistas curiosos nas redações brasileiras, alguem já se teria perguntado porque o PSOL está tão interessado na libertação de Battisti? Onde, afinal, começa a mobilização do partido do qual é um luminar a filha do sr. ministro da Justiça, pela libertação do assassino italiano?

A resposta está à mão para quem quiser procurá-la.

Figura como o “ideólogo” do PSOL, outro assassino italiano homiziado no Brasil. Ele participou da fundação do partido da senadora Heloisa Helena e hoje vive de formular os termos dos irados ataques que as publicações da agremiação dirigem contra o PT de Lula, “vendido à democracia burguesa”.

Achille Lollo

Trata-se de Achille Lollo.

Filho de uma abastada familia romana, não agradava a Lollo, como a Battisti, conquistar o poder na Itália convencendo italianos. Preferia as armas. Na madrugada de 16 de abril de 1976, este nobre “filósofo”, com mais dois comparsas, esgueiraram-se pelas escadas de um modesto conjunto de apartamentos do bairro operário de Primavalle, em Roma, levando um galão de gasolina. No terceiro andar, morava a família de Mario Mattei, gari de profissão. O varredor de ruas, entretanto, era ligado ao Movimento Social Italiano, neo-fascista, fato que, para os que pensam como o nosso senador Nery, justifica uma execução.

Achille Lollo tambem pensa assim.

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As 2:30 da madrugada, este herói da luta armada italiana, tomando os devidos cuidados para não acordar suas vitimas, derrama os cinco litros de gasolina por baixo da unica porta que havia no apartamento e ateia fogo.

A familia é acordada pela explosão das labaredas na sala. Em pânico, a mãe toma nos braços os dois menores entre esses inimigos de morte da esquerda armada italiana, Gianpaolo, de 4 anos, já coberto de queimaduras extensivas, e sua irmã Antonella, de 9, e corre para o andar superior. As duas filhas mais velhas, de 15 e 19 anos, tambem conseguem subir. Seriam resgatas pelos bombeiros, ao fim da tragédia.

Mas Virgilio, de 8 anos, fica cercado pelas chamas. Stefano, o irmão mais velho, de 22 anos, hesita. Mas volta para socorrer o pequeno. As chamas cortam-lhes a saída e o calor sobe a níveis insuportáveis. Os dois correm para a janela, em busca de ar. Lá embaixo, o bairro inteiro assiste impotente à tragédia. Com o rosto derretendo, Stefano grita da janela até ser silenciado pelas labaredas…

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Quando os bombeiros finalmente conseguem entrar, encontram o pequeno Virgilio, carbonizado, agarrado às pernas do irmão morto.

O episódio choca de tal maneira a Itália que até hoje, nos aniversários do crime, há romarias à rua Bibbiena, onde são depositadas flores em memória das vitimas.

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Pois é o autor deste feito heróico, que revoltou seus próprios comparsas do Partido Operário a ponto de denunciá-lo à polícia, que “faz a cabeça” da nossa candidata a presidente da Republica e da filha do nosso ministro da Justiça. E é o partido em que todos eles se congraçam que patrocina a campanha pela libertação de Cesare Battisti…

Sem sombra de duvida, o Brasil já lutou por causas melhores.

luciana-genro2

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