Em capitalismo nada se cria, tudo se copia

22 de novembro de 2021 § 16 Comentários

A partir dos meados dos 1980s Kenishi Omahe se foi tornando uma presença cada vez mais assídua na imprensa ocidental. Tendo ocupado altos cargos em diversas empresas de ponta do Japão, ele foi nomeado, na sequência, o chefe do escritório da McKinsey para Ásia e Japão e projetou-se como o mais conhecido divulgador das técnicas de gestão japonesas nos EUA, especialmente do sistema “just in time” inventado pela Toyota.

O Japão deixara de ser o patinho feio do capitalismo, célebre pelos produtos vagabundos que exportava. Tornara-se melhor que o original e despontava como o Japão que conhecemos hoje deixando de lado o padrão americano de planejamento de curto prazo com foco na “satisfação dos acionistas” pelo planejamento de longo prazo de visão mais estratégica e foco na qualidade. Ele escrevia artigos regularmente e publicou diversos livros que tornaramse best sellers não apenas entre os especialistas. O sucesso foi tanto que no final dos 90 mudou para os Estados Unidos onde dava aulas na UCLA e em Stanford e era uma estrela nas palestras sobre eficiência.

Àquela altura o mundo já tinha andado bastante. Lembro-me de um de seus livros que começava com a descrição dos vôos das sextas-feiras entre Tóquio e Seul onde todos os passageiros se conheciam mas passavam a maior parte do tempo disfarçando, sem se cumprimentar, com as caras enfiadas em jornais. Eram técnicos importantes e até CEOs dos grandes grupos japoneses que viajavam para a Coréia onde, num fim-de-semana, ganhavam mais que o salário do mês no Japão, para ensinar aos coreanos os segredos das indústrias japonesas.

Nada de novo…

Uma geração antes o Japão bancava milhares de seus melhores cérebros para estudar nas melhores universidades americanas ou empregar-se nas suas melhores indústrias para aprender com eles e depois fazer melhor em casa.

Os próprios Estados Unidos não se tornaram a maior potência industrial do mundo por outro expediente. Um dos capítulos mais fascinantes do indispensável “Alexander Hamilton” de Ron Chernow é o que descreve como o genial primeiro Secretário do Tesouro do governo de George Washington e seu fiel assistente, Tench Coxe, criaram o que viria a ser a Society for Establishing Useful Manufactures (SEUM), nos albores da grande nação americana.

Hamilton e Coxe decidiram que o melhor meio de competir com a Inglaterra, àquela altura a maior potência industrial da Terra era, numa mão, trazer para os Estados Unidos a qualquer preço os melhores executivos das indústrias inglesas, mesmo sob pena de desafiar as leis daquele país e, na outra, enviar espiões a soldo do Tesouro Nacional para a antiga mãe-pátria para aprender a construir (e melhorar) as máquinas e tocar as indústrias que as usavam.

Tão cedo quanto março de 1791 os Estados Unidos estavam patenteando os Moinhos (têxteis) Parkson, mesmo admitindo que eram cópias melhoradas dos ingleses. Naquele mesmo ano criaram oficialmente a SEUM, financiada por capitais privados, que lançou as bases de indústrias de papel, tecidos para velames navais, processadoras de algodões e linhos, sapatos femininos, costuras industriais, chapéus, cobertores, carpetes, cervejas, etc.

Hamilton argumentava com os muitos inimigos do seu governo que “pelo espírito da imitação a sociedade americana iria florescer em negócios domésticos comparáveis aos ingleses”. Ele selecionou pessoalmente os principais diretores do empreendimento entre cidadãos nacionais e estrangeiros para a criação de um polo de difusão de indústrias em New Jersey, e lançou ações na bolsa para financiá-lo, mesmo sob as críticas da América rural que, apadrinhada por nomes do calibre de Thomas Jefferson e James Madison, reclamava incentivos iguais. Sob ataques ferozes dessa oposição, foi movido a produzir, com Coxe, o “Report on Manufactures” para prestar contas desse investimento, pelo qual também foi atacado em função da concepção aumentada dos poderes da União que embutia.

O resto dessa história – da Coréia aos novos “tigres” do Sudeste Asiático e à China – já é mais familiar para os leitores de hoje.

Enquanto isso na nossa América, que de volta às mãos de um Portugal que, subjugado pela Espanha, expulsara de Pernambuco os judeus que foram fundar Nova York, o ódio à eficiência campeava solto. Lembro sempre de um episódio descrito em outro livro fascinante de um “brasilianista”, o A ferro e fogo, Uma história da destruição da Mata Atlântica, de Warren Dean, que contava as desventuras de um inventor que, lá pelos 1700, concebeu um forno muito mais eficiente que os usados nos engenhos brasileiros e teve de ir implantá-lo nos canaviais do Caribe de tanto que foi hostilizado pelos usineiros daqui que execravam aquele sujeito que queria ensinar padre nosso ao vigário.

Warren Dean fazia cálculos sobre quanto da Mata Atlântica teria sido poupada só com a adoção daquela invenção, mas na minha cabeça a história batia diferente. Era uma prova da ancestralidade da distorção que até hoje nos mata. Nas sociedades regidas pelo privilégio, onde a eficiência não é o fator decisivo de sucesso, muito pelo contrário, qualquer manifestação de competência é uma ameaça a ser eliminada e não um avanço a ser assimilado e disseminado.

Até hoje é assim, menos para a fatia graças a deus crescente da nossa economia que, apesar de tudo, conseguiu internacionalizar-se.

Cabe esperar que aprendamos a lição antes de termos de tomar duas bombas atômicas na cabeça para nos civilizarmos politicamente, como os japoneses, ou mergulhar em profundezas tais de miséria que justifiquem o canibalismo e a deglutição de baratas, escorpiões e morcegos, como os chineses, e nos tornemos os próximos asiáticos. Com o jogo de cintura em que a nossa doença política nos vem especializando ha 521 anos, o Brasil vai dar show de bola assim que se tornar humilde o bastante para começar, também em política, engenharia institucional e educação, a imitar sistematicamente os melhores!

Duas visões sobre conservação ambiental

1 de outubro de 2013 § 3 Comentários

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Proclamação Presidencial

Através da caça e da pesca esportivas, tradições que vêm passando de geração em geração, as famílias têm estreitado os seus laços e as pessoas comuns vêm forjando a sua conexão com a Natureza. É gente que se levanta antes do sol nascer para lançar uma isca através da neblina nas águas de um riacho ou para esperar a caça enquanto a floresta vai aos poucos despertando. Pais têm ajudado seus filhos a tirar o seu primeiro peixe ou a aprender a lingaugem dos pássaros. No Dia Nacional da Caça e da Pesca nós celebramos essas velhas tradições e renovamos o nosso compromisso de preservar os locais que têm sido o palco delas.

Trabalhando em todos os níveis do governo junto com organizações privadas e defensores da conservação ambiental, meu governo lançou a Iniciativa em Favor dos Esportes de Natureza. O objetivo é envolver todos os americanos comuns na luta pela proteção e restauração desses biomas e dessas águas que amamos tanto e restabelecer a relação de cada cidadão deste país, independentemente da sua origem ou da sua idade, com os esportes de natureza. Os pescadores e caçadores esportivos têm feito a sua parte, levando adiante a tradição e atuando como uma das maiores forças da Nação na defesa dos ambientes selvagens.

Para além do aspecto da valorização de antigas tradições, os esportes de natureza sustentam milhões de empregos. A caça e a pesca são responsáveis por um segmento essencial dessa indústria, incentivando o turismo, fortalecendo a economia nacional e financiando programas de conservação com a compra de licenças de pesca ou iniciativas  como o Selo do Pato (uma das mais antigas e eficazes iniciativas de arrecadação de fundos entre caçadores para a compra e preservação de banhados).

Neste dia, enquanto refletimos sobre a valorização que a caça e a pesca trazem para nossas vidas – do reforço dos laços de família à renovação do nosso apreço pela natureza – vamos tratar de garantir que as futuras gerações terão a mesma oportunidade que nós de desfrutar essas experiências.

É por tudo isso que eu, Barak Obama, Presidente dos Estados Unidos da América, pela autoridade que me é investida pela Constituição e pelas leis deste país, proclamo o Dia 28 de Setembro de 2013 como o Dia Nacional da Caça e da Pesca Esportivas. Convoco todos os cidadãos a honrar este dia com programas e atividades apropriadas à data.

E para tanto assino neste 27º dia de setembro do ano do senhor de 2013 e no 238º ano da Independência dos Estados Unidos da América.

BARACK OBAMA

É graças a esse espírito e às políticas que dele decorrem que os Estados Unidos da América, a maior economia do mundo com seu território plenamente integrado ao processo de exploracão econômica, é também o país/continente com a maior área de ambientes selvagens preservados em proporção ao todo, mais que a própria África, e com populações de fauna nativa, especialmente as espécies mais caçadas, frequentemente maiores que as que se calculava que existiam na época do descobrimento.

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Enquanto isso, no Brasil…

(reproduzo o artigo “Enquanto as florestas ardem” que escrevi em março de 1999 para o extinto Jornal da Tarde; avalie você mesmo se algo mudou para melhor desde então)

Segundo a revista Nature, a área devastada na floresta amazônica pode ser o dobro dos 16,8 mil quilômetros quadrados calculados pelo Inpe.  Esta é apenas a última das sucessivas notícias de recordes de destruição da natureza reproduzidas anualmente na imprensa brasileira.  Não obstante, nem o governo nem as ONGs que integram o Conama, sem o beneplácito das quais nada acontece em matéria de política ambiental no Brasil, se rendem ao clamor desses resultados.  Os ambientalistas de gravata voltam às suas pranchetas e, com suas assessorias jurídicas, produzem uma nova catadupa de leis violentas e inúteis e os políticos se apressam em aprová-las.  E todos vão dormir com a consciência tranqüila enquanto as motosserras cantam e a floresta insubstituível arde.

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Tem uma força irresistível, como se vê, o fenômeno que tanto impressionou Warren Dean, autor de A Ferro e Fogo, Uma História da Destruição da Mata Atlântica, que é na verdade uma história da violência do desenvolvimento econômico brasileiro, de nossa renitente aversão à ciência e dos raros quixotes que, ao longo de nossa história, tentaram provar as vantagens dela sobre o preconceito, que, como já dissemos aqui, mais de uma vez, deveria ser adotado como livro obrigatório em todas as escolas do Brasil.

O que vai levando à irremediável perda do último ecossistema ainda em condições de ser conservado no Brasil e no planeta são, muito mais do que a ignorância e a brutalidade dos agentes diretos desse crime, o empedernido apego aos preconceitos e a recusa deliberada da ciência, da técnica e até da prova do ensaio e do erro, cuja descoberta levou o homem a dominar o planeta, por parte daqueles que, em posição de reformar o

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distorcido direcionamento das políticas ambientais brasileiras, insistem na mesma linha que vem fracassando há 499 anos ininterruptos, mesmo estando de posse de amplo conhecimento de tudo que, no resto do mundo, produziu resultados positivos no sentido da conservação ambiental.  A tal ponto que, a esta altura, nos perguntamos se, em boa parte dessas organizações, não estará morto o ideal em nome do qual elas foram criadas, e traídos os heróis da luta pela implantação de uma consciência ambiental no Brasil que as puseram em pé, tendo tomado seu lugar o apego ao poder e às luzes da mídia e, em alguns casos, também o amor ao dinheiro, que flui com disposição tanto maior, de contribuintes bem-intencionados de todo o mundo, quanto mais dramáticos forem os relatórios da destruição.  E isto porque a única ação dessas organizações que produz resultados concretos (novos aportes de fundos) é a elaboração desses relatórios, invariavelmente mais dramáticos do que o último, no que, ao mesmo tempo, correspondem à realidade e denunciam a completa inocuidade da ação dos que os subscrevem para deter a destruição.

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Para conseguir deter essa destruição, sabem as ONGs, sabe o governo brasileiro, sabe o mundo todo, só há um caminho, nesta sociedade humana, cuja característica principal e cada vez mais dominante é a de ser economicamente dirigida em tudo que faz ou deixa de fazer. É a pressão econômica que destrói os ecossistemas.  E só uma pressão econômica mais forte poderá salvá-los, como intuiu Theodore Roosevelt há exatos 100 anos.  Hoje, neste mundo poluído onde o mercado é a força onipresente e incontestável e os espaços abertos e a natureza intacta têm o valor que ele atribui a tudo que é raro, a intuição de Roosevelt se transformou numa realidade pujante que, em toda a parte, com a única exceção do Brasil, emprega, educa e rende, enquanto vai resgatando ecossistemas da sanha de madeireiros e outros predadores, para reformá-los e devolvê-los à natureza.

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Associada à técnica e à ciência, que só ela pode produzir e sustentar, a economia dependente da conservação ambiental tem produzido milagres em todo o planeta.  O tamanho esmagador dos recursos que se levanta, ano a ano, com o turismo, cada vez mais disputado, ligado à caça e à pesca esportivas – o mais diretamente dependente do bom manejo da fauna e da flora, objetivo central de qualquer política ambiental digna desse nome – e a outras formas de turismo ecológico – que, sem a caça e a pesca, não se interessa senão por sítios de menor importância ambiental e maior apelo visual – levou, há muito tempo, à superação da discussão sobre o melhor retorno econômico dos espaços em disputa por outras formas de exploração.  A vantagem dessas formas de exploração ambientalmente positivas é uma realidade esmagadora, e essa indústria avança rapidamente, em todo o planeta, com exceção do Brasil, restituindo à natureza áreas antes ocupadas pela agricultura, pela mineração ou pela exploração madeireira, infinitamente menos rentáveis.

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O governo brasileiro e as organizações de ambientalistas estão cansados de saber disso.  Seria impossível que não soubessem, dada a abundância de informação a respeito em todas as mídias do planeta e à infinita multiplicação dos casos de sucesso.  Mas aquilo que ninguém discute no resto da Terra continua sendo tabu no Brasil, continua sendo proibido por lei apesar do resultado catastrófico de nossa insistência no errado.  Na verdade, o foco da resistência está hoje nas organizações ambientalistas que se deixaram seduzir pelos apelos do poder e pelo jogo de cooptação que se pratica em Brasília, e trocaram as botas e barracas pelos ternos e gravatas.

É um fato notório que, em todas as áreas técnicas de todos os órgãos ambientais federais e estaduais do País, existe a convicção de que não há saída para a tragédia ambiental brasileira fora da que o mundo inteiro encontrou.  Falta, apenas, coragem política para enfrentar a resistência preconceituosa de algumas ONGs com assento no Conama que, indiretamente, ajudam a sustentar a corrupção que grassa nas camadas políticas dos órgãos ambientais, e os batedores de caixa que os sustentam na mídia mais desinformada (especialmente na tevê).

E, enquanto isso, as motosserras cantam e as florestas ardem, à espera de que amadureça o movimento ambiental brasileiro.  Dará tempo?

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