O Uber e o poderoso chefão

5 de agosto de 2015 § 29 Comentários

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O conflito Uber versus taxistas vem disputando firmemente nas últimas semanas o segundo lugar como prova, já não direi da canina fidelidade da imprensa de hoje à opção preferencial pelo raciocínio do establishment político que ela expressa em quase todas as suas coberturas do que se passa no país, mas de uma recusa nada menos que religiosa em expressar qualquer um que lhe seja próprio que é para o que esse desvio está evoluindo.

É uma pena porque esta é uma rara oportunidade para fazer ver ao vivo e a cores à esta população atarantada pela multiplicação em metástese das suas misérias sem ter nenhuma idéia exata sobre de onde vêm elas, por qual tipo de mecanismo a doença brasileira, uma vez instilada nas veias da Nação pelos traficantes de sempre, passa a se auto reproduzir de forma inteiramente autônoma.

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Considerando-se que entender o mecanismo de reprodução de qualquer vetor de pragas é a única maneira de controlá-las, compreender-se-á imediatamente o peso nefasto dessa omissão.

O que é o motorista Uber de hoje senão o taxista de ontem?

Não foi um prefeito qualquer que teve a idéia, lá nos albores da era do automóvel, de instituir um serviço de alguel ad hoc daquela nova maravilha mecânica a quem, andando a qualquer hora pela rua, achasse conveniente pagar a outrem pela carona que pudesse leva-lo mais rápida e confortavelmente daqui para ali.

Simples e brilhante, a idéia espalhou-se pelo planeta na exata proporção da sua conveniência universal.

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Mas não demorou nada para que, pelo mundo afora, “prefeitos” de todo tipo de partido e de regime político e suas variações menos bem acabadas passassem a arrogar-se o direito de cobrar de quem sustenta assim a própria família uma grossa quantia por uma “licença” para fazer esse trabalho no “seu território” sem incorrer na ira da “sua” força armada.

Assim como Tiradentes fez-se enforcar e esquartejar antes de concordar em dar a tal tipo de parasita 20% do resultado do seu próprio esforço  e, por menos ainda do que isso, a Inglaterra tenha sido forçada a abrir mão do vasto território que são hoje os Estados Unidos, deve ter havido muita revolta e resistência quando pela primera vez um deles meteu a mão no bolso dos proprietários de automóveis de alguel para roubar-lhes, sem nada ter feito, nem pela invenção da máquina, nem pela invenção dessa nova maneira de usá-la, uma parte substancial do que eles suavam para ganhar.

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Hoje, entretanto, entregamos-lhes 41% (contado só o “por dentro“) sem chiar…

O golpe é velho como a humanidade. Tudo que hoje nos é “imposto” com muito palavrório e vaselina começou a nos ser enfiado goela abaixo em troca da vida, pura e simplesmente, por quem tinha a mão mais pesada no cabo da espada sobre quem não tinha condições físicas de enfrentá-lo. Como roubar trabalho alheio desde sempre rendeu muito, os brutamontes contrataram exércitos para dar “escala” ao seu bom negócio, passaram a morar em palácios e chamar-se “reis“, pagar “intelectuais” para dourar a pílula e justificar essa nova forma de escravidão e, mais adiante, empregar padres e juristas para amarrar bem os argumentos destes e fazer deles “leis divinas”, ainda que feitas aqui mesmo no chão. E como o bicho homem é aquele que a tudo se adapta, estabelecida a nova regra do jogo, assim ele passou a ser jogado.

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O único momento difícil em que se oferece alguma resistência a esse tipo de violência tem sido, historicamente falando, o de currar a vítima pela primeira vez. Aceito o fato consumado, porém, o violentado passa a ser o mais zeloso agente da continuação do seu próprio estupro, sob o mesmo tipo de argumento que agora anima a contenda contra os Uber: “Se eu sou obrigado a pagar à máfia, não posso concorrer com quem inventa um jeito de prestar o mesmo serviço sem ser obrigado a faze-lo. Estupre-se todos, portanto“!

O raciocínio lógico, evidentemente, seria o seguinte: “Mas porque, diabos, eu tenho de pagar à máfia? Como foi que embarquei na roubada de me acostumar a isso? Ainda bem que eles me abriram os olhos! Chega! Vou aliar-me aos Uber para deixar de pagá-la também e ter carros e ganhos tão bons quanto os deles porque esta é a maneira mais justa e honesta de ganharmos todos os que trabalhamos para comer, dos prestadores aos usuários do serviço de aluguel de carros”.

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Os jornalistas brasileiros de hoje não conhecem a história do seu métier  e nem têm informação clara sobre o que ele está institucionalmente titulado para fazer nas democracias que é, precisamente, forçar o establishment político a marchar na direção em que ele não tem nenhum interesse direto de andar. Foi isso que aconteceu nas democracias que evoluíram o bastante para dispensar aspas exatamente porque uma imprensa atenta e aguerrida o bastante deu, sempre que preciso, a necessária contribuição à organização da maioria lesada para impor-se à minoria lesante.

Onde, entretanto, a imprensa comportou-se de forma “cínica, mercenária, demagógica e corrupta”, como temia Joseph Pulitzer, ou simplesmente de forma omissa e subserviente como se comporta a nossa, formaram-se públicos “vis” e morreram democracias, nos casos em que se chegou a tanto, ou públicos tão omissos e subservientes “quanto ela mesma” (a imprensa), como vaticinou esse pai do jornalismo moderno.

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E eis aí os nossos taxistas, vítimas do estupro de ontem, aliados ao estuprador para instá-lo a não permitir que saiam virgens os novos taxistas de hoje, em vez de juntarem-se a eles, como seria lógico, para mandar os estupradores para onde eles merecem estar.

Já viu que barulho poderia resultar, neste país estuprado de cabo a rabo, de orientar pelo raciocínio das vítimas essa pauta, em vez de continuar, como em todas as outras, apenas esticando passivamente microfones e gravadores até as bocas de sempre para amplificar “urbi et orbi” a ameaça das falsas “leis divinas”  impostas pelos estupradores?

Talvez até a pátria acabasse sendo salva…

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