Torquemadas de todo o mundo, uni-vos!

17 de novembro de 2015 § 28 Comentários

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Artigo para O Estado de S. Paulo de 17/11/2015

Só ha um deus e Maomé é seu profeta“, diz a bandeira do Estado Islâmico. “Alá é grande” é a última coisa que ouvem as vítimas da sua truculência. Mas esses deuses absolutos têm muito pouco a ver com aqueles outros que nasceram para explicar as maravilhas e consolar as dores deste mundo. Só aparecem, na história da humanidade, depois que ela aprende a se organizar pela violência.

O wahabismo, a tal “corrente radical do Islã” em que “se inspira” o grupo Estado Islâmico é só uma tática de assalto ao poder que, como o leninismo, funciona exatamente porque não põe nenhum limite à violência que emprega para conquistá-lo e mante-lo. Não é uma questão de sutilezas na interpretação da palavra de deus (ou de Marx). O wahabista (como o leninista) é aquele que se dispõe a empunhar a arma e puxar o gatilho; a torturar e estuprar filhas diante de seus pais. Os islâmicos sem mais nem menos (como os que por aqui saltavam “o muro”) são os que levam os tiros, os que são estuprados, os que se atiram ao mar.

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Alá o escambau!

O tamanho do prêmio é quanto basta para explicar essa brutalidade toda. “Fazer deste mundo o inferno é o caminho para o céu aqui mesmo na terra”, é o sinal com que a realidade instalada no Oriente Médio de hoje acena. Se você tiver estômago para ser implacável o bastante pode se tornar o rei da sua própria arabia saudita.

Deus será você mesmo!

Só o assassinato randômico rende a onipotência, grau máximo da embriaguez pelo poder. Por mais unânimes, bizarras e degradantes que se tornem as demostrações públicas de “” das vítimas tentando evitar o suplício, elas nunca serão suficientes. O fatalismo é um ingrediente imprescindivel. É preciso que tudo agrida a lógica e o senso de justiça; é preciso que não haja explicação; é preciso que não exista meio de garantir isenção ou prevenir o pior. A onipotência alimenta-se de doses regulares de sangue. Não ha ponto de chegada. Quando todos os “hereges” se tiverem “convertido“, os assassinos redefinirão a heresia para continuar assassinando.ei8

A primeira, de todos os tempos, é a mais básica. Mate para não ser morto. É daí que vêm os “soldados”. O resto da “mensagem” são “os meios” de cada momento. A de hoje é a do congraçamento planetário do mal. Porque não se agora dá? Torquemadas de todo o mundo, uní-vos! Que venham os psicopatas e os suicidas! Adeus ao tédio do crack e da heroína. Ha muito mais emoção em explodir e ser explodido.

A humanidade já viu isso em todos os tempos, em todas as línguas e em todas as latitudes. Essa é a história de todos nós. A barbárie é o padrão e o terror tem sido o instrumento universal da conquista e da manutenção do poder desde que há memória, inclusive nessa Europa das monarquias absolutistas que vieram cruxificando, degolando e queimando hereges até “ontem“.

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Mas desde a fatídica sexta-feira 13 de Paris ha uma avalanche de tentativas de explicação mais sofisticadas da barbárie. É um perigo pois discutir as “razões” de assassinatos em massa é abrir espaço para que seus autores as forneçam e para que se apresente quem as aceite. A idéia de que a barbárie tem de ter uma “causação” racional decorre daquela crença de que o homem é essencialmente bom e tem de haver a interferência de algo externo para corrompê-lo. A história e a ciência apontam para o contrário. A barbárie é que é o estado natural da espécie, e ela tende a se tornar total sempre que é aparelhada de uma “religião“.

O Estado Islâmico é o fenomeno dos morros cariocas com ambições exponencialmente multiplicadas; o crime organizado com domínio sobre um território e amado/odiado por uma população imersa no horror que não tem a quem mais recorrer, só que sentado em cima de um mar de petróleo. Em que momento o chefe de uma quadrilha vira um rei e um complexo de favelas vira um estado nacional como o Iêmen do Sul? Historicamente a resposta tem dependido tanto da geografia quanto da oportunidade. Lá foram a corrupção e a guerra; aqui foi a corrupção sozinha que se encarregou dessa metade da receita. O resto depende do tamanho do butim.

August 9, 2014

A luta pelo poder sem limites tem uma lógica própria. Perder o poder que se instala e se mantém pelo assassinato significa a certeza de ser assassinado. Daí o vale-tudo. A cada “chefão” morto corresponderá uma nova guerra pelo seu espólio. Foi para deter a infindável espiral da barbárie nesses infernos dentro dos quais o suicídio na flor da idade passa a ser uma opção racionalmente palatável que a democracia foi inventada. Mas foi preciso esperar pelo surgimento de um território isolado por um oceano de distância do mundo culturalmente dominado pelos degoladores e torturadores de sempre e seu aparato “religioso” para que a idéia do império da lei encontrasse um chão onde pudese fincar raízes sem ser arrancada, supliciada e queimada viva à vista de todos para reafirmar o império do terror.

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Fala-se, agora, num “sofisticado aparato” que teria sido necessário para perpetrar os assassinatos de Paris. Mas o que houve de essencialmente diferente neles dos que Al Capone protagonizava na Chicago do século 20, dos que o PCC perpetrou em São Paulo em 2006, ou ainda, das chacinas endêmicas do Brasil? O problema é o inverso; é a facilidade com que qualquer um pode perpetrar uma barbaridade, especialmente se não fizer questão de sair vivo da experiência.

O terrorismo é uma doença crônica tanto quanto o crime organizado e diferencia-se dele muito mais pelo tamanho das ambições envolvidas do que pelas condições que os tornam resilientes. Deus só entra nisso como coadjuvante e confundir as coisas é fazer o jogo do inimigo. As multidões que têm invadido a Europa não escolheram esse caminho. Gostariam de ter ficado em casa se o Estado Islâmico não estivesse lá. A solução para os dois problemas é uma só e a mesma. É imprescindível “ocupar os morros” e garantir a segurança neles, ou nunca haverá paz “no asfalto”. E para isso é necessário que todas as vítimas joguem juntas e a favor de uma “polícia” que faça por merecer essa confiança.

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Leia mais sobre as

Raízes históricas do wahabismo

The world wide war

11 de janeiro de 2015 § 49 Comentários

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As grandes novidades da parada são a vontade de morrer e a inexistência de objetivos ou motivações territoriais. Matar o maior numero de “inimigos” é tudo que eles pretendem.

A geração dos “games” — é a arte que imita a vida ou a vida que imita a arte? — já nasce e passa a juventude co-vivendo a saga virtual de “lobos solitários” de arma na mão caçando gente na rua. E partir disso para a ação no mundo físico é a “droga pesada” da hora para quem não se encaixa mais neste mundo. Não mais o suicídio moral e físico a conta-gotas do mergulho nos entorpecentes ou a saída pelos temerários “esportes” ultra-radicais com que costumava-se procurar a morte no passado.

O “cool“, agora, é matar para garantir que se vai morrer literalmente como nos “games“, com alguém apertando um botão lá no Arkansas que dispara de um “drone” insuspeitável, voando silenciosamente lá perto da estratosfera, um pequeno míssil para atingir no olho esquerdo o alvo lá do outro lado do mundo.

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E então o jogo segue para o próximo estágio…

Antigamente as guerras acabavam quando o preço em vidas da sua continuação se tornava pesado demais para um dos lados. Também é por aí — garantindo a certeza infalível do castigo — que as polícias e os tribunais do mundo civilizado contêm a criminalidade. Mas com um dos lados desejoso de morrer essas formas de dissuasão deixam de fazer efeito.

Sendo o “inimigo” visado por eles qualquer um, não havendo qualquer intenção de conquista territorial e passando a morte no final a ser o grande objetivo a ser conquistado, a guerra perde o foco e a perspectiva de ter um fim previsível. Guerras assim não podem ser ganhas ou perdidas por nenhum “lado“, a não ser o das vítimas selecionadas “at random“, como numa loteria, para serem mortas em cada ataque. E assim torna-se crônica como o crime comum é hoje na vida das grandes cidades.

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O que tudo isso faz com os fundamentos éticos e morais da civilização ocidental é que é o grande problema. Se tudo é mero acidente e a vida é uma loteria, que sentido fazem os limites que aceitamos e os sacrifícios que nos impomos em nome da substituição da lei da selva por uma condição de segurança e previsibilidade que nos permita concentrar-nos no trabalho e no desenvolvimento da ciência? Onde a meritocracia — que substitui a lei do mais forte (ou do mais bandalho) nessas sociedades consensuais — encontra guarida nessa nova realidade? Afinal, não é assim também até na ordem planetária onde a “harmonia dos mundos” saiu de cena para dar lugar às grandes explosões que criam ou destroem planetas a esmo?

Eis aí o desafio deste Terceiro Milênio..

Filosofias aparte, no entanto, para salvar vidas agora o que se requer são remédios bem práticos. Se toda essa barbárie é um caminho para se chegar ao paraíso, haverá que se considerar negar aos que assassinam em nome de Maomé a morte de “mártir” da “jihad” que é a recompensa que procuram, e tratar, ao contrário, de torná-los “impuros” de modo a serem barrados para sempre naquele harém cheio de virgens lá do céu, como teria feito o general “Black Jack” Pershing nas Filipinas.

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Reza essa história que pouco antes da 1a Guerra Mundial houve uma onda de ataques terroristas de islamistas radicais contra as forças norte-americanas naquele pais que os Estados Unidos tinham “herdado” da Espanha derrotada na Guerra Hispano-Americana. O general Pershing capturou, então 50 elementos do grupo terrorista, amarrou-os aos postes de execução por fuzilamento mas, antes da ordem de fogo, fez seus soldados trazerem alguns porcos para o local da execução e matá-los na frente dos terroristas horrorizados. Os muçulmanos, especialmente os radicais, têm horror a porcos que consideram um animal “impuro“. Não podem tocar na sua carne e no seu sangue sob pena de ficarem instantaneamente barrados para todo o sempre nas portas do paraíso. O general Pershing teria feito, então, com que seus soldados mergulhassem as balas com que fuzilariam os terroristas no sangue dos porcos e dado a ordem para a execução de 49 dos 50 prisioneiros. Seus corpos foram, a seguir, atirados numa cova comum e por cima deles foram espalhadas as entranhas e os pedaços dos porcos mortos. Terminado o espetáculo, o 50º terrorista foi solto e, pelos 42 anos seguintes não houve um único ataque terrorista muçulmano em qualquer lugar do planeta.

Essa história pode não passar de mais uma dessas lendas de que a internet anda cheia, não tenho como aferir, mas que a idéia é boa é boa. Se é da vida após a morte que se trata e é por ela que se mata o remédio é aceitar a temática deles e condená-los à danação eterna, o que, como se vê, é muito mais fácil, eficiente e barato.

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Não seria um remédio absolutamente completo porque essa “lógica” do martírio na “jihad” já pulou a cerca do redil maometano mais primitivo e se transformou na escolha de 9 entre 10 das almas penadas deste mundo, como indica o número crescente de filhos da abundância e da boa educação de países desenvolvidos que agarra a bandeira negra da “volta ao Califado do século 7“. Mas com certeza afetaria a matriz dessa fábrica de agentes da morte, o que comprometeria seriamente as linhas de produção e treinamento desses assassinos espalhadas pelo Oriente Médio e outras esquinas do mundo.

Sobrariam, então, só os loucos sem fé privados do apoio e da sustentação dos financiadores de tudo isso que jogam outro jogo — o Grande Jogo do Poder — no qual a conquista de territórios e populações a serem escravizadas continua sendo a condição para ganhar autonomia financeira nos volumes que bancar uma guerra global e permanente exige e a morte continua sendo o fim do caminho.

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