Por um choque de conexão!

30 de abril de 2019 § 16 Comentários

Artigo para O Estado de S. Paulo de 30/4/2019

O Brasil Oficial precisa um “choque de conexão”. Tem de ser radicalmente plugado ao Brasil Real. Hoje este só existe em véspera de eleição. Está excluído de tudo para além do momento em que deposita o voto na urna. “As reformas” são uma novela sem fim cujos capítulos, sempre “decisivos”, o país assiste à distância ha gerações. “Desta vez vai”! Mas o roteiro é exclusivo do grupo da privilegiatura momentaneamente investido do Poder Executivo, vivendo o papel para ele inédito de pagador e não apenas de gerador de contas, mais os seus interlocutores únicos: o resto da privilegiatura. Pelo País Real, feito touro de arena, entra no picadeiro sozinho, para ser desmontado, o ministro da Economia da vez. No final, todos “cedem”, docemente constrangidos, aos seus próprios interesses porque a condição de “governo” é temporária, os empregos e as aposentadorias públicas é que são para sempre.

Não é que esteja faltando convencer alguém. Não há mais o que discutir. Não há mais o que argumentar. Todo mundo está convencido não só da iniquidade criminosa da situação como, a esta altura, da iminência do desastre, mas Miami e Lisboa são logo alí.

Falta entrar nesse debate quem tem tido o sangue chupado. Quem vai ter de continuar aqui. O Brasil sonha esquerda x direita mas acorda nobreza x plebeu. “Velha política” é a de político sem patrão, intocável. “Nova política” só quando todo mundo souber quem pôs cada um deles onde está e eles passarem a ter medo que os seus eleitores os tirem de lá todo santo dia; só quando formos nós a dar a ultima palavra sobre as leis que aceitamos acatar. Esperar que uma nova política nasça de mais regulamentos baixados pela velha é ilusão de noiva.

Estão aí as Forças Armadas para não nos deixar mentir. O orçamento delas já era uma miniatura do orçamento do Brasil. ¾ do dinheiro vai pra salário. R$ 81,1 bi de 107,7 bi. O gasto com reservistas é maior que com militares da ativa porque lá, como no resto do serviço público, os aposentados, sempre precoces, são remunerados pelo provento máximo. Nas FAs eles custam, por enquanto, R$ 46,2 bi por ano contra contribuições previdenciárias de R$ 2,4 bi. O resto paga o favelão nacional que não se aposenta nunca. O que sobra para investimento em equipamentos de defesa, que é a parte que nos cabe nesse latifúndio, é o mesmo que sobra para investimento em infraestrutura, educação, saude e segurança públicas na União, nos estados e nos municípios. Estão orçados para este ano R$ 9,8 bi, 16% menos que em 2018, número que irá de menos em menos até o amargo fim empurrado pelas fórmulas de “reajustes” automáticos que a privilegiatura ativa ou aposentada se atribui como “direito adquirido”, se nada mudar muito nesse meio tempo.

E já sabemos que vai mudar, só que para pior. Como toda a discussão se dá exclusivamente entre eles e com base exclusivamente nos parâmetros deles, não será corrigida a pornográfica defasagem para cima do salário inicial de R$ 18 mil do ascensorista do Congresso em relação à realidade do favelão nacional. Será, sim, corrigida a defasagem para baixo do salário do general em relação ao dos ascensoristas do Congresso.

A “alternativa militar” na sua vez no poder após 34 anos de ostracismo resolveu o seu, portanto. Tomou distância do Brasil plebeu e está agora pau-a-pau com a privilegiatura.

E o desemprego? A economia paralisada? A guerra civil que mais mata no mundo?

Quem?! Como?! Aonde?!

A gente do poder tem mais o que fazer. Mas se valer olhar pelo buraco da fechadura do banheiro, é bom lembrar, nem o papa resiste. Carlos Bolsonaro solto na rede é o buraco da fechadura do banheiro da família do presidente da republica escancarado. Anda sempre à beira de um ataque de nervos. O dedo puxa o gatilho antes da participação do cérebro. Com ele tudo logo vira um enredo “família Bórgia”. Na equipe, no palácio, no Brasil, no mundo, tudo é uma só e mesma conspiração. Com o filósofo esotérico esbravejando por cima essa “nóia” toda ganha um endosso “teórico”. E então, dia sim dia não, o ratinho que sai de um buraquinho vira um ratazão, vira um tigre-leão.

Nos albores da internet ganhou enorme notoriedade o “email-bomba”. O cara chegava em casa vindo do boteco e começava a “desabafar por escrito” no computador. Vomitava tudo de mais azedo que tinha atravessado na garganta desde priscas eras, como fazia antes de si para si. Só que no final, “uósh”, lá ia o bomba para o computador de alguém onde ficava gravado para todo o sempre para ser lido, relido e cem vezes amargado. E de lá vinha outro do mesmo calibre, vazado naqueles termos que nos sobem à veneta na hora da raiva mas que se repetidos em voz alta não passariam na polícia do bom senso.

As regras de convivência, a ceriônia e o mínimo de polidez exigidos no trato social até pelos indivíduos mais toscos, foram moídas pela internet onde o “convívio” se dá entre solidões. Você, o semi-analfabeto, o “noiado”, todo mundo conversa na rede sozinho no seu canto, trancado no banheiro, sem ouvir o que ele próprio está dizendo, sem ver a reação das pessoas na hora, sem o concurso do tom de voz, da expressão do rosto, do gestual, enfim, que dá a cor e o peso ao que é dito e ouvido, sem esclarecer os mal entendidos. O que passa de um computador para outro nessas discussões é o texto sem contexto nem revisão. Despido. Árido. De pedra.

O resultado é a guerra. Mundial e de todos contra todos, cada vez mais. Babel. Coisa de Exú.

Isso arrebentou tantas amizades, tantas empresas e tantas famílias que um dos primeiros aplicativos que fez sucesso na lojinha da Apple foi um que procurava sinais de excesso de substâncias intoxicantes no texto dos emails digitados após o anoitecer (erros de grafia, palavrões e etc.) e aplicava um bom questionário ao seu autor buscando aferir o grau de consciência critica que lhe restava antes de libera-lo para envio.

Sumiu. E pelo que está pintando, vai levar 5 gerações para o 03 entender a importância fundamental dos ritos do poder. O diabo é que o Brasil não tem nem mais 5 minutos pra perder.


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§ 16 Respostas para Por um choque de conexão!

  • Fernando Lencioni disse:

    Eu já desisti!!!! Fechei o único meio digital que tinha para difundir ideias e… desisti!!!!! O filósofo brasileiro – “cuspidela” – não consegue compreender o sistema como um todo pq só ficou fechado em seu mundinho de escritor e se esqueceu que a ciência que não se foca em mudar mundo para melhor com propostas pragmáticas é a mesma que ele critica ser feita nas universidades brasileiras. Ninguém ajuda a pensar nem a convencer a realizar as reformas realmente necessárias. Mas sabe pq? Pq é aí que o bicho pega. No bolso de quem tem poder. E aí meu filho. Tem que sair pro pau. Pq ninguém vai abrir mão de privilégios nababescos de bom grado. Mas brasileiro filho. É o povo mais covarde que existe. Aqui não ia ter guerra civil comi tiveram os americanos e etc etc. Sabe pq? Veja as fotos de todos os conflitos no mundo. É um mundo de sofrimento e sacrifícios que nos trouxe até aqui. Exceto aqui no Brasil que sempre quer que “alguém” faça por ele o que deve ser feito pelo povo. Covardes!!!!!!!!!!!!!!!! Desisto!!!!!!!!!! Isso aqui não tem solução.

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    • A. disse:

      Lutar é pra poucos. Raros! Feitos de um “barro” mais nobre! “Seu” Lencioni, o sr. só faz jus a um adjetivo: covarde! (e receba um abraço, pra não dizer que estimulo ódios!)

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      • Fernando Lencioni disse:

        De covarde se o sr me conhecesse saberia que não tenho nada. Sou e sempre fui um guerreiro. Desde menino defendendo os mais fracos contra os mais fortes. Luto karatê há 40 anos e atiro desde os nove. O sr não me conhece. Cale-se. E não se engane, sou uma pessoa que pensa principalmente. Mas tenho princípios inalienáveis e por eles eu bato com os punhos e com a inteligência. E com armas se for necessário para legítima defesa. O sr não me conhece. Se o sr estivesse aqui olhando nos meus olhos o sr não diria isso a não ser que estivesse disposto a defender sua posição até o fim. É por isso que esse meio digital não presta. Cale-se. E tenha mais respeito pelos outros e pelas suas opiniões.

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      • Fernando Lencioni disse:

        Nem a coragem de colocar o seu nome o sr tem, mas tem ocidental desplante de me chamar de covarde. É só isso que meios digitais produz. Nada.

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    • A. disse:

      Baseei minha resposta na sua frase: “Desisto!!!!!!!!!!”.
      Não sou homem de palavras, por isso tenho de procurá-las em quem as conhece. Aceite “SE”, como um pedido de desculpas, já que ficou melindrado com meu comentário.
      Se

      Se és capaz de manter tua calma, quando,
      todo mundo ao redor já a perdeu e te culpa.
      De crer em ti quando estão todos duvidando,
      e para esses no entanto achar uma desculpa.

      Se és capaz de esperar sem te desesperares,
      ou, enganado, não mentir ao mentiroso,
      Ou, sendo odiado, sempre ao ódio te esquivares,
      e não parecer bom demais, nem pretensioso.

      Se és capaz de pensar – sem que a isso só te atires,
      de sonhar – sem fazer dos sonhos teus senhores.
      Se, encontrando a Desgraça e o Triunfo, conseguires,
      tratar da mesma forma a esses dois impostores.

      Se és capaz de sofrer a dor de ver mudadas,
      em armadilhas as verdades que disseste
      E as coisas, por que deste a vida estraçalhadas,
      e refazê-las com o bem pouco que te reste.

      Se és capaz de arriscar numa única parada,
      tudo quanto ganhaste em toda a tua vida.
      E perder e, ao perder, sem nunca dizer nada,
      resignado, tornar ao ponto de partida.

      De forçar coração, nervos, músculos, tudo,
      a dar seja o que for que neles ainda existe.
      E a persistir assim quando, exausto, contudo,
      resta a vontade em ti, que ainda te ordena: Persiste!

      Se és capaz de, entre a plebe, não te corromperes,
      e, entre Reis, não perder a naturalidade.
      E de amigos, quer bons, quer maus, te defenderes,
      se a todos podes ser de alguma utilidade.

      Se és capaz de dar, segundo por segundo,
      ao minuto fatal todo valor e brilho.
      Tua é a Terra com tudo o que existe no mundo,
      e – o que ainda é muito mais – és um Homem, meu filho!
      =Rudyard Kipling=

      (Um abraço!)

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    • marcos andrade moraes disse:

      UAU, carateca que dá tiro é valente pra chuchu. Mas inteligente? Não, seu artigo é arrogante, elitista e fartamente distante de tudo que foi escrito aqui há tempos.

      MAM

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  • marcos andrade moraes disse:

    “Sumiu. E pelo que está pintando, vai levar 5 gerações para o 03 entender a importância fundamental dos ritos do poder. O diabo é que o Brasil não tem nem mais 5 minutos pra perder.”

    Pois é, então nos diga. Por que votou neles? Leia Andreazza hoje, no O Globo. Tá tudo lá! Como vc não viu? Medinho PT?

    MAM

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  • O fato é que estão propondo uma reforma da previdência sem reforma da impudência. Não se fala nos privilégios absurdos, como se eles fossem inamovíveis, o que por si só é o melhor argumento para continuarem articulados para desmanchar o futuro que nos prometem como solução para o presente. Se o nosso Supreminho entendeu por bem desfazer uma lei de 1990 que encerrara benefício de pensão para filhos de funcionários públicos, uma reforma, qualquer que seja, vai ligar o cronômetro do desmanche ali na frente por uma decisão dos urubus da Constituição.

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  • Herbert Sílvio Augusto Pinho Halbsgut disse:

    Hoje Fernão Lara Mesquita em sei texto “Por um choque de conexão” nos escreveu acima que “As regras da convivência, a cerimônia e o mínimo de polidez exigidos no trato social…”, e com tudo o mais que escreveu parece que fez o vespeiro se agitar. Que bom! Mas não nos esqueçamos que somos todos mortais, por mais guerreiros que sejamos em prol da coisa pública – republicana -, mesmo tendo acesso a Internet, com seus benefícios e mazelas que separam e dividem aqueles que podem atuar melhor em prol de um Brasil para todos. O respeito acima de tudo, a lhaneza no trato não destrói e agrega mesmo os que tem opiniões diversas em muitos aspectos da delicadíssima realidade que vivemos. Nós que apreciamos pensar para agir com cidadania não nos devemos exasperar, ao contrário dirigirmos a nossa atuação de forma mais focada na união pela democracia, que tanto buscamos, Sinto isto ao ler os comentários de todos os que aqui opinam, mesmo naqueles contrários. Para mim esta é uma das riquezas do Vespeiro. Apesar de todas as mazelas que enfrentamos, devemos persistir. Lembrei-me dos versos de ” Ode à Alegria ” do poeta alemão Friedrich von Schiller , que mesmo romântico, não deixou por menos: “O Freunde, nicht diese T”one!” – Ó amigos, não esses sons!”. Mas, por favor, não percam a verve que têm e gostaria que continuassem nessa lide saudável para a democracia: o debate para um rumo para um Brasil democrático. Assinei em Change,Org a petição de Marcelo Issa e Roberto Seviano ao Senado Federal intitulada “senado-reverta=decisão-sobre-anistia- a-partidos”.

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    • Herbert Silvio Augusto Pinho Halbsgut disse:

      Peço-lhes vênia, mas a ortografia do nome de um dos propositores da petição ao Senado é Roberto Liviano, e não Seviano como escrevi.

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    • Herbert Sílvio Augusto Pinho Halbsgut disse:

      Peço vênia, mas a ortografia correta do nome de um dos autores da petição ao Senado, que citei acima em meu comentário, é Roberto Liviano.

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      • Herbert Silvio Augusto Pinho Halbsgut disse:

        Escreveu? Confira! E depois confira de novo! Assim dizia Júlio de Mesquita aos seus jornalistas. Digo isto porque me vejo obrigado pela terceira vez a corrigir meu erro ao grafar o nome de ROBERTO LIVIANU, que juntamente com Marcelo Issa propuseram o abaixo assinado.

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  • Jota disse:

    Fernão, você viu que Bolsonaro revogou o decreto nº 8.243, de 23 de maio de 2014 que institui a Política Nacional de Participação Social (que você tratou aqui https://vespeiro.com/?s=SNPS)? Maravilha hein!!?

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  • Antonio Brigolatto Carmona Barrionuevo disse:

    É uma pena, para o povo sofrido, surrados, pisados, explorados, os eternos peregrinos do sofrimento e da ignorância, somos um país riquíssimo, temos tudo de bom em abundância, temos muitas terras agriculturáveis, muita agua, muitos minerais, alguns raríssimos, muitas matas, com uma flora e fauna de dar inveja em qualquer país, muito petróleo, uma costa marítima com 6.000 quilômetros de extensão, próprias para pesca e turismo, um povo com uma mistura de raças, que não se encontra em lugar nenhum do mundo. Não temos terremotos, furacão, maremoto, vulcanismo, gelo seis meses no ano e não damos certo. Os políticos que colocamos para nos governar, sempre acham um jeitinho para manter as absurdas mordomias que matam tudo o que encontram pela frente, são iguais as pestes de fungos e insetos daninhos. O temos tudo fica só para eles e as classes de servidores públicos privilegiados, para os eternos peregrinos do sofrimento e da ignorância sobra a conta para pagar.

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