Porque “fulaniza” nossa Maria Antonieta

30 de junho de 2017 § 21 Comentários

Artigo para O Estado de S. Paulo de   30/6/2017

Temer não é mais problema. Demore quanto demorar para arder o herege – o Brasil junto – os especialistas em regimento do Congresso asseguram que não restará “janela” entre o processamento das diversas “fatias” da acusação que lhe foi imputada e o calendário eleitoral que permita a votação da reforma da Previdência. Ao dr. Janot, passam, portanto, a interessar somente os próximos passos. Por isso é ele mesmo quem subscreve a Adin (Ação Direta de Inconstitucionalidade) contra a lei de terceirização que abriu a fila das reformas do trabalhismo de achaque.

Nada disso! Nem um passo atras!

Como a terceirização é aquele novo padrão de trabalho que fez a China virar o que é saindo do zero e pos o Brasil fora da economia moderna, a “justificação” dessa Adin vai com todas as marcas registradas da nossa “privilegiatura”. Nada a dizer sobre o mérito do sistema nem sobre quanto tem custado proibi-lo para umas tantas gerações de brasileiros da plebe. Tudo pende de um alegado “vício formal” de tramitação remontando a Lula em 2003 cinco anos apos o já atrasado começo do arrastar dessa materia em 1998 com FHC. Tudo devidamente esmiuçado num daqueles tijolos de, no mínimo, 800 páginas com que tudo se resolve no Judiciário brasileiro. Quem quiser que leia.

Já vamos para 19 anos de enrolação só nesse abre e fecha da mera porta de acesso à pista onde se dá a competição global. Não é atoa, portanto, que o país estrebucha.

Brasilia não. Brasilia vive fora do mundo, assim como vive fora do Brasil que vive dentro do mundo. Ignora-os olimpicamente. Pode fazer isso porque os salários da última gente “meritissima”, “excelente”, “egrégia”, “eminente” e “magnífica” que ainda reina sobre plebeus na face da Terra, assim como as suas aposentadorias de 100%, os aumentos de todos os anos e, sobretudo os “auxílios” de furar teto constitucional isentos de imposto de que eles se locupletam todo santo mes enquanto acusam o resto do mundo de desonestidade, não dependem de desempenho como os salários do Brasil que vive dentro do mundo. É por isso que Rodrigo Janot pode se dar a glória de ser a nossa Maria Antonieta e nos impor, um atras do outro, “excelentes negócios” como mais este do “fatiamento” do pacote JBS. Qualquer coisa a gente come bolos…

O que ha de mais triste neste país triste em que nos transformamos é a ululante obviedade de tudo … e a forma como, ainda assim, permanecemos bovinamente na fila do martelete na testa, repetindo os discursos indignados contra a lentidão com que ela anda a que os “fulanizadores” reduzem o que devia ser o debate nacional. A guerra do Brasil tem mesmo de ser “fulanizada” porque, olhada sem emoção, a questão conceitual, distributiva, institucional, de justiça sem aspas ou o que quiserem chamá-la envolvida é inargumentável. Tudo é de uma transparência absoluta: 5% da população, os 10 milhões de funcionários públicos, “comem” 46% do PIB (36% de carga + 10% de deficit por ano) que não viram rigorosamente nada que beneficie os 95% que a sustentam. Ha para eles direitos especiais, foros especiais e até juros especiais, e mesmo assim não basta porque até a distribuição de privilégios é perversa dentro do “sistema”. A tal ponto que as castas que já não cabem no país estão deixando de caber também umas dentro das outras. Somente os 980 mil aposentados da União, a cereja desse bolo, “comem” 57% da arrecadação bruta do ente que mais arrecada neste país (70% do total). Se a medicina avançar menos do que está previsto serão 30, 40, 50 anos mais que os marajás sem trabalho permanecerão pendurados nas nossas costas. Como não tem mais de quem tirar aqui fora e é preciso pagar ainda os marajás com (algum) trabalho e o mais que a gente sabe, os barnabés dos municípios, a camada mais baixa da “privilegiatura”, está passando de predador a presa nesta fase terminal em que o estado passou a se alimentar de si mesmo.

Depois de Porto Alegre, Rio de Janeiro e Belo Horizonte, Curitiba é a última capital do Brasil “rico” que se ve no limiar da incapacidade de honrar sua folha de funcionários, estágio que só se atinge, na ordem de prioridades vigente, depois de mortos os empregos privados, os hospitais, as escolas, a segurança pública, esgotados todos os limites de endividamento até à oitava geração e devoradas até as reservas do FGTS sob a guarda do estado.

Sendo a proporção de 95% para 5% do eleitorado, medidas de austeridade têm passado com maiorias confortáveis nos legislativos que, com todos os defeitos e desvios, vivem de voto e representam o país, como iam passar também no Lesgislativo federal. Como no voto não leva, segue-se, então, o roteiro fascista, sempre igual a si mesmo: o sítio violento às casas de leis, as gritarias para impedir que se ouça os discursos reformistas, o desbaste dos ajustes pela chantagem das corporações mais poderosas, o circo dos “movimentos sociais” que, com os mesmos onibus, barracas, “manifestantes” e provocações, vai de cidade em cidade parando o trabalho pelo bloqueio do trânsito. E depois que fracassam todas as tentativas de enfiar povo nessas provas de “impopularidade” das medidas aventadas para atalhar a apropriação de tudo pelos donos do estado, recorre-se ao Judiciário, o poder acima de qualquer delação, para desfazer o que foi feito no voto, com gambiarras formalistas quando possivel, “fulanizando” o debate para blinda-lo contra a racionalidade sempre, promovendo armações ilimitadas e até coroando “reis” que, sozinhos, valem mais que o Legislativo e o resto do Poder Judiciário somados para se impor a qualquer custo.

Um país em desespero tem alimentado a “aposta” de que “eles” não serão tão loucos para destruir completamente o que pretendem herdar. Mas isso não é o que a História ensina nem para onde aponta esse desbragado mamar, não numa situação de estabilidade que será insustentável no futuro, mas numa realidade caótica que já não se sustenta no presente.

Ninguem se iluda! Este é o duelo final. Ou instituimos de vez a igualdade de direitos e deveres e acabamos com a “privilegiatura”, ou ela acaba de acabar conosco.

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§ 21 Respostas para Porque “fulaniza” nossa Maria Antonieta

  • Tony Abreu disse:

    muito bom artigo concordo com vc Fernão

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  • Olavo disse:

    Fantástico artigo…..

    As únicas atitudes que devemos esperar do setor público..
    Sangue, suor e lágrimas… isso apenas.

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  • Márcia disse:

    Estamos assistindo a que os participantes do BBB da Privilegiatura são capazes de fazer para segurar seus “prêmios”. Aqueles outros, os da telinha, nós já sabemos a que ponto chegam por R$ 1 milhão _ uma mixaria, em comparação ao que está em jogo neste BBBdoP.

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  • Tony disse:

    Fernão, você tem o dom da escrita. Traduz em palavras o que nós gostaríamos! Infelizmente o povo, e também a única força capaz de resolver isso tudo (as FFAA) estão apáticos.

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  • Carmen Leibovici disse:

    está tudo esquadrinhado,explicado ,demonstrado.a desgraça do Brasil está neste estado cafajeste dentro do Estado brasileiro.
    seus componentes serão expurgados.espero que logo.não dá mais para suportar tamanho ultraje.

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  • Olavo Leal disse:

    Fernão:
    Brilhante artigo, estupendas palavras!
    O Brasil tem jeito, apesar de Brasília (nada contra os verdadeiros brasilienses).

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  • mario disse:

    Muito bom!
    Mais um artigo primoroso.

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  • Para atacar a privilegiatura impõe-se distinguir direito adquirido de direito usurpado, tendo em mente que o direito usurpado possui respaldo “legal” mas lhe falta respaldo moral. A questão acadêmica não oferece maiores dificuldades; a questão crucial é convencer os privilegiados. Este último problema é mais sério, mas admite solução – mais de uma. É só pensar.

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  • Vinte e nove anos da Constituição “Cidadã” e chegamos a tal estado de
    coisas. Vinte e nove anos, noventa e seis emendas e ” os justiceiros” a
    vomitar verborragia inútil. Três dias para votar uma questão de ordem.
    A presença onipresente do PGR, promovido a justiceiro mor. É desanimador. Um juiz prende e condena a quinze anos. O reu recorre e é absolvido. Diferença abissal da tal “dosimetria”. Enquanto isso, na Ilha
    da Fantasia acontece almoço em torno de Zé Dirceu. Desanimadot!!!

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  • José Luiz de Sanctis disse:

    A roubalheira legal e ilegal não tem fim. Não tem perigo de dar certo, a não ser que o povo milagrosamente acorde.

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  • marcos a. moraes disse:

    Mas se ele é a nossa Antonieta, a solução é por demais conhecida… Pra ler e reler.MAM

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  • Marcos disse:

    Excelente essa ordem de prioridades brasileira para mante-los com seus privilégios “legais”:
    Assassinam-se a iniciativa e os empregos privados, destroem-se os hospitais e as escolas, acaba-se com a segurança pública (60 mil assassinatos por ano, salve-se quem puder), endividamento lá nas estrelas.
    Por fim, a autofagia dos marajás é o último estágio.

    O Brasil está acabando. Viva o Brasil!

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  • marcos a. moraes disse:

    Acaba de acabar conosco é impagável….Maravilha! Tô replicando…MAM

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  • OSMAR PRATES disse:

    Uma pequena sugestão: Comparar este custo com os apurados na roubalheira do Petrolão, os do Petrolão devem ser titica de galinha.
    Um abraço.

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  • jeanmorgado disse:

    Sem desmontar a brutal maquina estatal, eliminar cargos e salarios vitalicios – os tais “direitos adquiridos ” – o pais está fadado a bancarrota, menos para a casta dominante e os funcionarios publicos de medio e alto escalão, que promovem a blindagem da cleptocracia institucionalizada. Atualmente o governo e os legisladores estao ocupados em sugar a classe média até a medula, para em poucos anos chegarmos ao 10/90%, sendo 90% o povo nivelado por baixo e uns 10% a casta de politicos e funcionarios milionarios… qualquer Venezuela, Cuba é assim…

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  • Nelson disse:

    Para ser perfeito, este artigo do Fernão Lara Mesquita teria que ter sido escrito na pedra.
    Nossos políticos e o setor público em geral têm voracidade ilimitada para privilégios de toda a ordem e pouco se importam com o futuro do brasil e mesmo de seus descendentes, não se importando em levar o país a cavar mais ainda no fundo do poço moral em que se encontra.
    Temer e Aécio, dentre tantos outros, pouco se importam com seus atos, mas apenas lamentam a publicidade sobre seus crimes.
    A solução do Brasil é tão simples que se torna utópica, bastando pagar salários e pensões do setor público até os limites estabelecidos incluídos os penduricarios, duplicidade de funções e congeneres, tributar em 35% as pensões do setor público na parte excedente ao limite de R$ 5.500 do INSS e congelar concursos públicos por 10 anos, remanejando pessoal, privatizando e criando mais parcerias com o setor público.
    Tão simples que é impossível, pois o Estado é um fim em si mesmo e seu custo e gigantismo está determinado a destruir toda a nação.

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  • Adriana disse:

    Muito bom o artigo! A privilegiatura que quer estar sob as outras não aceita mais leis, as interpretando de modo que por jurisprudência signifiquem comando diferente daquele aprovado no legislativo. Não se submetem, como em países civilizados, a confirmação de permanência pela população distrital. Afinal, sendo um dos 3 poderes, e o poder acima ser o povo, todos os 3 ao povo devem se submeter, pelo voto distrital (sistema adotado por todos os
    países admirados).
    O poder tem que ser restituído ao povo. Enquanto isso não ocorrer, sob a falácia de que somos inferiores e não sabemos votar, aqueles que deveriam nos servir se servirão dos
    brasileiros.

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  • Paulo César Carrijo disse:

    Quem são dentre todos, desde de Barnabé I, O Venturoso, que até os dias de hoje acumula privilégios sobre privilégios a ponto de se tornarem castas intocáveis de um sistema injusto e concentrador? Os funcionários públicos é a resposta correta, porém, pior, muito pior fica quando, na hierarquia funcional das castas públicas, tem se a destacar a maior de todas, qual não seja, a casta dos Procuradores e da Defensoria Pública e do judiciário de uma maneira geral. Caso os políticos e jornalistas, dentre outros, dessem os nomes aos bois de quem consome a riqueza nacional, talvez as coisas um dia viesse a melhorar. A reforma da Previdência deveria ser feita a partir deles e ao povo explicado de forma didática para que tudo ficasse absolutamente claro. Não haveria um voto de desaprovação por parte da população, podem ter certeza.

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