Golpe de jiu-jitsu

28 de fevereiro de 2015 § 34 Comentários

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Artigo para O Estado de S. Paulo de 28/2/2015

Não ha explosões nem rupturas. Não ha socos nem chutes fulminantes, à Anderson Silva. Golpe, hoje, é de jiu-jitsu. A luta é no chão, lenta e sufocante como aperto de cobra. Nada de muito espetacular acontece. Persistente, insidiosa e inexoravemente, os braços e pernas da cidadania no Legislativo e no Judiciário, vão sendo agarrados, torcidos, imobilizados; o país vai parando, exausto, e o estrangulamento econômico é que leva aos tres tapinhas no final.

É esse o script bolivariano. Depois vem o caos…

Mas em países da pujança e da complexidade do Brasil o buraco é mais embaixo. Tiroteio no morro é sempre impressionante mas diz pouco sobre o que rola no alto comando do crime organizado. Com o “petrolão” acontece coisa parecida. Se quiser saber onde é que essas guerras realmente são decididas, siga o dinheiro.

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A “caixa preta” do BNDES e dos fundos de pensão estatais está para o “petrolão” como o armamento nuclear está para as armas convencionais na guerra pela construção do “Reich de Mil Anos” do PT. Luciano Coutinho é a Dilma competente. O “true believer” que sabe o que faz. Mas por tras de tudo e por cima de todos paira Luis Ignácio Lula da Silva, o que não acredita em nada. A este, com seu faro e instinto fulminantes para o poder, não custou um átimo entender o potencial que tinha o fascínio do doutor Coutinho pelo sistema coreano dos Chaebol. “Aparelhar” esse fascínio foi brincadeira para o nosso insuperável virtuose na arte de servir doses cavalares de dinheiro para os ricos e de mentiras para os pobres enquanto atiça uns contra os outros e é amado por ambos, arte em que se iniciou, já lá vão 40 anos, frequentando a ponta da ponta do capitalismo cínico de seu tempo, aquele sem pátria das multinacionais automobilísticas do ABC paulista. Foi ali que ele aprendeu a comprar pequenos privilégios para a clientela dos metalúrgicos que o mantinha na linha de frente do jogo do poder a custa de garantir lucro fácil às multinacionais pondo o resto do Brasil andando de carroça paga a preço de Rolls Royce. Foi ali que ele entendeu a força que o dinheiro tem, a resiliência dos laços que ele cria e a conveniente característica de moto contínuo que os esquemas amarrados com ele engendram, realimentados pela corrupção e pela miséria que eles próprios fabricam.

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Do esquema coreano de “empresas-mãe” recheadas de dinheiro do estado entregues a um indivíduo ou a uma família, cercadas de pequenas “empresas-satélites” amarradas a elas pelo elo pétreo da sobrevivência econômica nasceu a versão macunaímica dos “campeões nacionais” do BNDES e dos fundos de pensão estatais dos quais hoje dependem cada vez mais o fornecimento de todos os insumos e a absorção de toda a produção – e portanto todos os empregos – da vasta periferia da economia que orbita esses ungidos do estado petista.

A diferença está em que se na Coréia a explosão da corrupção e a instrumentalização política da relação de dependência inerente aos monopólios de que até hoje, apesar do nível de educação conquistado por seu povo, aquele país não consegue se livrar, foi o corolário indesejável de uma vasta operação para criar a partir do zero um país e uma economia devastados pela guerra, aqui a trajetória foi exatamente a inversa. O PT não pensa no Brasil, o PT pensa no PT. Aqui, tudo começou para dotar um partido político de condições de impor sua hegemonia com o recurso à corrupção elevada à categoria de moeda institucionalizada de compra de poder e à criação de elos de completa dependência a monopólios politicamente manipuláveis de vastas áreas de uma economia pujante mas diversificada demais para o gosto de quem sonha com sociedades inteiras dizendo amém a um chefe incontestável que não desce nunca do trono.

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É essa segunda parte que decide o jogo e o resultado parcial está aí. Com pouquíssimas exceções, não ha mais força econômica de qualquer relevância fora do “esquema”. Só um rei e seus barões; tanto mais “relativos” estes quanto mais aquele se tornar “absoluto”. E se o agronegócio, calcanhar de Aquiles dos totalitários do passado, foi exceção por algum tempo, esse tempo passou. O universo da proteína animal, “chaebolizado” tornou-se galático; o da bioenergia, garroteado pelo golpe da “gasolina barata”, ou se multinacionalizou, ou não vive mais sem as veias pinçadas na UTI do governo. Eficiência empresarial? Esta “commodity” hoje compra-se. Os grandes “tycoons” do “setor privado” brasileiro que continuam voando em seus jatões cada vez mais obscenos são só os CEO’s a soldo de uma economia estatizada, ainda que vestindo roupas civis e não mais a farda militar de outrora.

Dilma Rousseff é um acidente de percurso. O “poste” plantado para ocupar o buraco que começou a acreditar que era ela que tinha sido eleita e quase pôs tudo a perder. Talvez ainda consiga, a prosseguir o patológico desemparelhamento entre seu discurso e a realidade. Mas já não é só nisso que se constitui o “pântano brasileiro” descrito pela Economist. O que está paralisando o Brasil é o PT real sem a anestesia chinesa, apenas acrescentado de extensas áreas de grave irritação cutânea provocada pela irrefreável pesporrência de madame.

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Para que os brasileiros enxerguem com clareza de onde é que isso tudo vem vindo e disponham do mínimo necessário para opinar sobre o destino que lhe querem impor antes que seja tarde a imprensa terá de tirar o bisturi da gaveta, lancetar com suas próprias mãos o abcesso que corrói o país por baixo dos “campeões nacionais” e fazer muito barulho para chamar a atenção de todos para ele. Os membros do exclusivíssimo clube dos “campeões” do BNDES, balofos e engurgitados de dinheiro público, almoçam e jantam diariamente em Palácio onde todos se dão tapinhas amistosos nas costas. Ali ninguém vai atirar em ninguém, não haverá prisões nem delações premiadas e jamais nos será “dado acesso” ao câncer que ha por baixo da ferida que, com todo mundo hipnotizado pelo tiroteio do “petrolão”, o país ainda mal vê.

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